Para Miguel Rossetto, Dilma sai destas eleições com enorme força política e legitimidade depois de derrotar a estratégia do ódio do bloco conservado.
“A presidenta Dilma sai destas eleições com enorme força política e legitimidade” depois de derrotar a estratégia do “ódio do bloco conservador” que imita os métodos desestabilizadores da direita venezuelana, declarou o ministro afastado Miguel Rossetto, coordenador de campanha e um dos homens de confiança da presidenta.
Ressaltou a aproximação entre o PT, a esquerda e os movimentos sociais que foi se amadurecendo ao longo da disputa caracterizada por uma “profunda politização”. Rossetto deplorou a “operação criminosa da Veja” para impedir a quarta vitória do PT e defendeu a reforma política para colocar fim ao financiamento empresarial de campanhas que “sequestra” a democracia, segundo afirmou durante uma hora de entrevista concedida à Carta Maior no comitê eleitoral em Brasília, enquanto trabalhadores tiravam os grandes cartazes da candidata que acaba de ser reeleita para governar o país até 31 de dezembro de 2018.
DILMA
“A presidenta Dilma sai destas eleições com uma enorme força política. Ela se entregou incrivelmente na campanha, saiu com uma autoridade muito grande. Foi uma vitória heroica e histórica. Ela tem consciência da responsabilidade de liderar esta agenda de reformas, de combate à corrupção no aparato estatal, de melhorar a qualidade dos serviços públicos. O país quer mais e ela vai responder a essa demanda da sociedade.
Ela emerge com uma enorme legitimidade de um processo eleitoral onde houve um intenso debate programático…a presidenta se posicionou sobre todos os temas transcendentes da agenda nacional.
Agora está chamando ao diálogo a partir desta agenda de transformações e quer incorporar esta dinâmica de mudança no segundo mandato. Ela mostrou sua disposição para que o Estado se incorpore à sociedade organizada, com um governo que se abra para a sociedade porque isto nos assegura transparência e eficiência. É positivo que haja uma pressão social permanente sobre a estrutura gerencial do Estado. Este segundo mandato trabalhará para aprofundar a república”.
POLITIZAÇÃO – ALEGRIA DO POVO
“É preciso destacar a intensidade e a profundidade da participação da sociedade. Houve um debate político duro dentro de um contexto de grande politização, poucas eleições foram disputadas, com um padrão de politização tão qualificado como o deste ano. Discutiu-se desde o Banco Central, os conservadores propunham a independência e Dilma questionou com argumentos muito fundamentados, a função dos bancos públicos, a política industrial, emprego, direito à educação, à saúde, direitos civis das mulheres, dos jovens negros, da homofobia até a política externa, que raramente entra em campanha.
E por que digo que fica uma herança da politização? Porque o debate entrou na casa dos cidadãos brasileiros… e este processo criou uma dinâmica favorável à Dilma com eleitores que se identificaram com as conquistas. A sociedade disse que quer mudanças, mas isso não significa desmanchar as conquistas destes doze anos.
Esta campanha resgatou a participação dos jovens, a campanha recuperou o protagonismo das ruas, o PT se reencontra com a as ruas, tivemos atos massivos de cem mil, 50 mil pessoas. Viajei muito com a presidenta nesta campanha e pude ver a alegria do povo. Esta alegria do povo derrotou o grito das elites brasileiras”.
LULA
“Tem uma liderança extraordinária, o companheiro Lula continua segundo um personagem extraordinário, o maior líder do nosso partido e teve um papel fundamental no processo eleitoral.
Sem dúvidas que sua participação foi fundamental para a vitória de Dilma. O presidente Lula tem e terá como líder político uma relação permanente com a presidenta Dilma, entre eles há uma relação de enorme confiança, lealdade e companheirismo político”.
DOIS POLOS POLÍTICOS
“Nestas eleições houve uma polarização que correu paralela a uma intensa politização. É importante levar em conta que esta campanha foi a quarta disputa entre o PT e o PSDB desde que o PT venceu em 2002. Foi o quarto enfrentamento de dois projetos de país. A memória política da sociedade brasileira já identifica muito bem estes dois grandes blocos, claramente opostos, que estão representados no PT com um projeto democrático popular e no PSDB como referência do polo conservador.
Essa polarização é aprofundada porque todas as vitórias do PT foram no segundo turno e, como estamos vendo nestes dias, a disputa não termina nas eleições. A radicalização que é vista todos os dias do polo conservador nos mostra que a disputa política vai continuar durante o governo da presidenta Dilma. .
Nós chegamos a estas eleições com conquistas extraordinárias, com mais igualdade, diminuição da pobreza, um país que saiu do mapa da fome publicado pela FAO, com quase pleno emprego, a renda do salário mínimo teve aumento de 72 % em 12 anos de governos petistas, o salário mínimo de hoje compra o dobro do que comprava no governo anterior (Fernando Henrique Cardoso). Em 12 anos houve uma revolução silenciosa, criamos 21 milhões de postos de trabalho e no governo Dilma foram 5,6 milhões e vamos chegar a 6 milhões em dezembro… hoje o filho do trabalhador pode ser um doutor, em 2002 o Brasil era a 13ª economia mundial. Hoje é a sétima. Reduzimos o endividamento líquido de 65% do PIB para 33% do PIB com reservas de 370 bilhões de dólares”.
DIREITA IMITA A VENEZUELA
“Grande parte da mídia e dos partidos do lado conservador quiseram ‘venezuelanizar’ a campanha, mas se enganaram porque o Brasil não é a Venezuela, aqui não há um Chávez. Essa polarização parecida com a direita venezuelana é organizada pelos meios com um discurso oposicionista sistemático contra o governo. Eu não digo que existem mídias golpistas, diria que são mídias com um discurso radical de desconstrução do governo, e tudo isto está associado às elites econômicas, parte das classes médias e dos partidos conservadores. Tudo isso compõe um bloco político forte.
Através do discurso do ódio, a direita ocultou a falta de um projeto, com o ódio ocultou que ia fazer um ajuste brutal, com o ódio ocultou o que ia fazer com as empresas públicas. Repare que eles nunca quiseram.
Acabam de derrubar no congresso um projeto sobre conselhos populares, mas não vejo isto como uma demonstração de força, é pura espuma para ocultar o revés que sofreram.
A oposição partidária está muito frágil, sua agenda neoliberal foi a grande derrotada destas eleições. Repare em um dado: eles não falam diretamente de privatizar, nem de afetar os direitos sociais porque a direita é incapaz de apresentar claramente qual é seu projeto. A direita tem um programa clandestino porque se ela o mostrar será defenestrada por uma sociedade que não quer perder suas conquistas.
Apesar de tudo isto, do ódio, das declarações radicais não vejo no futuro uma radicalização exagerada da sociedade brasileira.
Eu conheço a direita venezuelana, e a sociedade brasileira não se encaixa nesta forma tão radicalizada de comportamento. As estruturas políticas e as instituições brasileiras são diferentes das da Venezuela. Os conflitos de classe, os conflitos regionais brasileiros são diferentes. Aqui há um Estado mais legitimado, há uma república mais organizada.
Sabemos que há setores da imprensa que falam de impeachment da Dilma, mas não são toda a imprensa brasileira.
O Brasil tem uma organização democrática forte, tem movimentos sociais que permitiram conquistas importantes, tem uma cultura política que não está radicalizada como a da Venezuela. São dois processos históricos diferentes, mas as elites brasileiras imitaram as da Venezuela no ódio e no extremismo”.
VEJA, COMPORTAMENTO CRIMINOSO
“O resultado final, de 3,3% tem a ver com o movimento criminoso realizado pela revista Veja, da Editora Abril, na sexta-feira. Quando faltavam quatro dias para as eleições, mostravam uma vitória de 7 a 10 de todas os institutos de pesquisa, era evidente que havia um movimento de decolagem da Dilma e foi ali que chegou a operação da Abril, que na quinta-feira montou uma estratégia de manipulação da opinião pública e conseguiu com que parte de seu objetivo de afetar a campanha da presidenta. Fui uma ameaça à democracia. A Veja agiu com objetivos criminosos, não respeitou a ordem judicial. A Veja, associada a rádios e tevês, elaborou todo um plano de campanha a favor de Aécio, com apoio da TV Globo e do Jornal Nacional.
Cria-se um ambiente de comoção a partir de uma reportagem que não tinha nenhuma sustentação, nenhuma comprovação do que se dizia de Dilma e de Lula dentro do processo da Petrobras. Orquestrado associado foi o PSDB para interromper ilegalmente o crescimento de Dilma.
E depois de o TSE ordenar a interrupção dessa campanha ilegal, eles continuam violando a lei no sábado e no domingo. Milhões de e-mails oferecendo a Veja gratuitamente, e cópias da capas foram usadas como panfletos para favorecer Aécio. Mas é preciso dizer que este comportamento não foi o padrão de toda a imprensa, foi focalizado na Abril e na Veja, em parceria com o PSDB e outros meios.
O que a Veja fez foi tão grotesco que em um primeiro momento até a rede Globo evitou se juntar a essa invenção, apesar de depois ter divulgado”.
LEI DE MÍDIA
“Nestas eleições o voto da sociedade legitima que se inicie um processo de reformas… temos que realizar um debate que articule o direito à informação, à defesa intransigente da liberdade de imprensa, evitar todo tipo de censuras. Esta discussão é uma referência democrática que estará no debate com a sociedade, e o ponto de partida dessa reflexão será a experiência de uma sociedade que presenciou e agora tem sua opinião sobre a operação de manipulação criminosa da Veja”.
CAMPANHA COMEÇOU NA COPA
“A campanha eleitoral de hostilidade ao governo começa durante a Copa, eles tentaram desqualificar a competência do governo para organizar a Copa, que é um fenômeno cultural gigantesco, e portanto é um fenômeno político. Muita gente acreditou que a Copa não ia acontecer, que não ia ter transportes e ao final a Copa foi um grande êxito e as pessoas começaram a se desiludir. Uma parte da sociedade se desiludiu já no jogo de abertura quando uma parte do público, de elite, ofendeu brutalmente a presidenta. Ali se viu como seria o perfil de uma campanha que estimulou o ódio em relação à Dilma e ao PT”.
IMPACTO INTERNACIONAL
O Brasil sai fortalecido em um cenário internacional difícil, em uma crise que nos obriga a estarmos atentos ao que acontece no resto do mundo. Nossa democracia já completou sete eleições desde o final da ditadura, temos uma democracia sólida.
Temos consciência de que a vitória de Dilma é uma grande notícia para as forças progressistas e populares da América Latina, para o candidato da Frente Ampla do Uruguai, Tabaré Vázquez, para a presidenta Cristina Kirchner, na Argentina, para Michelle Bachelet no Chile. A América Latina está passando por um processo recente de governos democráticos, populares, soberanos, são processos que precisam de mais tempo para cumprir seus compromissos de mudança, a democracia se impõe contra a desestabilização da região, contra a desestabilização da Venezuela.
VISITA A WASHINGTON
CartaMaior: A presidenta Dilma recebeu ligação de Obama. Acha que a visita de Estado a Washington agora é mais provável?
Miguel Rossetto: A ver…não está garantida, todos nós desejamos relações normalizadas, reciprocidade nas relações de respeito mutuo entre nossos países.
Artigo originalmente publicado em Carta Maior.
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