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Fortalecer a UNE para avançar nas lutas democráticas

741719Por Clarissa Alves da Cunha, Estevão Cruz, Mitã Chalfun e Mirelly Cardoso *

A crise mundial e a Revolução Democrática no Brasil

Desde 2008, o capitalismo neoliberal encontra-se em uma crise estrutural e de graves consequências para todos os países, em especial para os/as trabalhadores/as. O que tudo indica é que abre-se uma transição para um novo período histórico com mais diferenciações entre os setores da economia mundial, entre as iniciativas das forças sociais e políticas relevantes, com lutas e processos decisivos que vão moldar, ainda, um novo período do capitalismo.

As características do novo período que se abre ainda estão em disputa, mas pode-se dizer que é marcado pela luta para reconfigurar o sistema político internacional e pela construção de alternativas pós-neoliberais. De um lado, os países centrais adotam medidas econômicas ultraliberais e substituem suas democracias por plutocraciais comandadas pelos funcionários do capital financeiro, derrotando pela força as tentativas de resistência popular. De outro, as dinâmicas em curso nos últimos 12 anos na América do Sul, criaram um ambiente propício para políticas sociais e econômicas com forte capacidade de inclusão social e com novas agendas progressistas.

Pela sua importância econômica e geopolítica, o Brasil tem exercido forte influência nas novas características da ordem internacional. O sucesso das medidas econômicas anti-neoliberais e as três vitórias eleitorais sobre o bloco histórico do neoliberalismo não só confirmam a grande influência das posições políticas brasileiras, diante da profunda crise de legitimidade do neoliberalismo em escala mundial, como também diferenciam a dinâmica nacional da internacional, protegendo o país de estragos maiores em meio à crise.

Os avanços conquistados em nosso país são provenientes de um modelo de desenvolvimento pós-neoliberal que tem retomado a valorização do trabalho e da participação popular. A classe trabalhadora se encontra, nesse contexto, em situação muito mais favorável para avançar em conquistas de reivindicações históricas no país. A ampliação do setor público e sua própria democratização nunca foram tão centrais na agenda política sindical e popular.

Ao mesmo tempo, temos ainda questões estruturais a serem enfrentadas e superadas para o aprofundamento da revolução democrática, isto é, de transformações democráticas na estrutura social, econômica e política do Estado brasileiro que permitam a superação do neoliberalismo e reponham a opção socialista no horizonte. Permanece, ainda, inalterada a natureza liberal do Estado Brasileiro, evidenciada, mesmo após 10 anos de governos populares, através da hegemonia dos capitalistas sob o sistema financeiro, a formação privada/oligopolizada da opinião pública e a concentração da propriedade.

A agenda da revolução democrática no Brasil reside na capacidade da esquerda brasileira reafirmar o público sobre o privado nas mais diversas esferas sociais. Consiste em uma ampla agenda de valorização e retomada de legitmidade dos serviços públicos, na construção de uma reforma política democrática capaz de republicanizar o Estado brasileiro, no enfretamento aos oligopólios nacionais e internacionais que dominam os meios de comunicação no Brasil, na desmercantilização das relações sociais, sobretudo no que tange a vida das mulheres e a divisão sexual do trabalho, e na construção de um agenda política que repare as desigualdade histórica entre brancos e negros no país.

No caso específico das políticas educacionais, o momento exige maior capacidade de enfrentamento com os setores privatistas que ainda mantém importantes espaços e legitimidade no governo e cuja força tem se expressado nas atuais posições do MEC em relação ao conjunto de programas em execução e ao Plano Nacional de Educação (PNE). Diferentemente do que ocorreu no segundo governo Lula, a atual gestão do MEC passou a conduzir uma política pragmática e economicista que mesmo produzindo maior inclusão social é incapaz de superar os impasses originados pelo projeto educacional da ditadura e do neoliberalismo. A mobilização estudantil é fundamental para alterar essa dinâmica.

O avanço nas agendas propostas estão intimamente ligadas com o fortalecimento da UNE. A entidade fica mais forte, amplia sua legitimidade social e aumenta sua capacidade de intervir nos rumos do país a cada vitória conquistada. A capacidade de conquistar vitórias e imprimir uma agenda positiva ao movimento educacional brasileiro permitiu à UNE reforçar o seu protagonismo na defesa da educação pública, gratuita e de qualidade e da juventude em geral.

Organizar os novos setores incluídos no ensino superior para fortalecer a UNE

A Kizomba está entre aqueles e aquelas que entende as vitórias dos estudantes brasileiros e o fortalecimento da UNE como um processo articulado. Ao mesmo tempo em que a conquista de avanços democráticos no país fortalece a UNE, a democratização da própria entidade amplia nossa capacidade de disputa da hegemonia no Brasil. Por isso, nos mantemos como principais defensores de uma nova cultura política para o movimento estudantil e compreendemos que hoje reunimos melhores condições para que nossos sonhos e utopias tornem-se realidade.

Caminhamos para o fechamento de uma gestão marcada por muito ativismo, militância e defesa, autônoma e intransigente, das pautas que mobilizaram e unificaram amplos setores dos movimentos educacionais e sociais. Em especial, a atuação da UNE na greve das federais foi importantíssima. No conjunto das universidades, os diversos campos políticos que compõe a entidade protagonizaram inúmeras lutas por conquistas de avanços nas realidades locais e nacionais da educação superior do país. Do ponto de vista nacional, a UNE foi a grande responsável pela conquista mais expressiva obtida nos últimos anos pelos movimentos sociais brasileiros: a aprovação na Câmara dos Deputados da destinação de 10% do PIB para a educação pública. O balanço positivo dessa gestão em relação às lutas dos/as estudantes e da juventude brasileira colocam a UNE em melhores condições para enfrentar os novos desafios que emergem a partir desse novo patamar a que chegamos no ensino superior do país.

Está ao nosso alcance conquistar no próximo período a aprovação de medidas que destinam 100% dos royalties do Petróleo e 50% do Fundo Social do Pré-Sal para a educação pública, tornando mais concreta a possibilidade do país investir 10% do seu PIB no setor. Esse novo cenário nos permite concentrar nossas lutas em torno da expansão e melhoria da qualidade da educação pública no país. Isso significa aprofundar as políticas de democratização do ensino superior público; reorganizar democraticamente as estruturas administrativas, pedagógicas e curriculares das universidades; e regulamentar o ensino superior privado, no sentido da sua completa desmercantilização. Essas são agendas que devem estar no centro da pauta e das nossas lutas na próxima gestão da entidade.

Para conduzir esses novos enfrentamentos, a UNE tem o grande desafio de organizar politicamente os amplos setores que acessaram o ensino superior no último período. Por meio do PROUNI, do REUNI, do ENEM/SISU e das Políticas de Cotas e Ações Afirmativas o ensino superior brasileiro dobrou de tamanho e vem modificando o seu perfil. Entre 2004 e 2010 houve aumento no número de estudantes trabalhadores (35% para 38%), na quantidade de estudantes de famílias com renda média mensal de até 5 salários minimos (65% para 67%), o percentual de mulheres se manteve majoritário, com 53%. Além disso, de 2004 a 2010, o percentual de estudantes não brancos subiu de 40% para 46%. Embora faltem dados sistematizados, esses percentuais certamente serão ainda maiores em virtude da consolidação do REUNI e da implementação da Lei das Cotas. Nesse sentido, a UNE, representada por sua direção nacional e pela rede de CA’s e DCE’s, precisa ampliar a sua capacidade de diálogo e sua intervenção criativa para envolver e organizar esse conjunto novo de atores sociais e de agendas.

Por um lado, é necessário aprofundar e acelerar a dinâmica de democratização da UNE, permitindo maior transparência e divisão de responsabilidades para a condução da entidade. Saudamos a criação da Comissão da Verdade da UNE, a publicação das contas da entidade no site da UNE, o empenho e seriedade na condução dos trâmites para o início das obras da sede da UNE na Praia do Flamengo, 132. Por outro lado, é fundamental instalar efetivamente os Conselhos Fiscais e Editoriais da entidade, pensar coletivamente formas de democratizar radicalmente os fóruns e eleborar estratégias autônomas e participativas de financiamento da rede do movimento estudantil.

Do mesmo modo, é necessário continuar criando espaços de participação da plurarilidade de vozes que compõe o movimento estudantil. A diversificação do perfil e dos interesses dos/as novos/as estudantes que acessaram o ensino superior exige a criação de novos espaços para além dos tradicionais fóruns de deliberação da UNE. O Encontro de Mulheres Estudantes e o Encontro de Negros, Negras e Cotistas da UNE têm respondido à uma realidade de um ensino superior cada vez mais majoritariamente feminino e com a presença de mais jovens negros/as. A participação da UNE na realização do VER-SUS inseriu a entidade na agenda de fortalecimento da saúde pública, fundamental para o avanço das lutas democráticas no país. É necessário reforçar ainda a sua intervenção nos espaços de organização LGBT’s e criar espaços próprios como os de auto-organização das estudantes mulheres e dos/as estudantes negros/as e ampliar o diálogo entre a rede da UNE e as entidades sindicais, reforçando a solidariedade e a construção conjunta de agendas que transformem a vida de uma parcela importante de jovens que estudam e trabalham ao mesmo tempo.

Por fim, a participação da UNE na II Conferência Nacional de Educação deve ser uma agenda prioritária para a próxima gestão. A experiência recente de participação na I CONAE reforçou a unidade e apontou para vitórias políticas do movimento educacional brasileiro como os 10% do PIB e a criação do Fórum Nacional de Educação. A UNE atualizou seu projeto de reforma universitária no seu último CONEB, apontando a centralidade da luta pela ampliação da qualidade no ensino superior brasileiro. A participação em todas as etapas da II CONAE deve ser prioritária para o conjunto dos/as estudantes brasileiros/as, tendo como norte estratégico o Projeto da UNE de Reforma Universitária e a atuação conjunta com o movimento educacional brasileiro.

Posicionar a UNE no bloco histórico da Revolução Democrática

Compreendendo a articulação entre as lutas democráticas na sociedade brasileira e o fortalecimento da UNE, entendemos que é fundamental o fortalecimento do campo democrático popular no interior da UNE. Essa unidade está na base das recentes vitórias do movimento estudantil brasileiro e do processo de ampliação da legimitidade da UNE no seio dos estudantes.

Nesse sentido, defendemos a unidade de todos os setores democráticos e socialistas do movimento estudantil brasileiro para posicionar a UNE no bloco histórico da revolução democrática. A unidade desse campo avança na ofensividade e reorganização colocada hoje aos movimentos sociais no Brasil e fortalece nossa entidade enquanto impulsionadora desse campo político e social.

A Kizomba se prõpoe a ser a cada dia mais parte deste processo de transformação. Por isso, ampliamos nos últimos anos nossa presença e nossa responsabilidade com a atuação na UNE e nas diversas entidades do movimento estudantil brasileiro. Nos propomos a compor com cada vez mais responsabilidade e mais capacidade de imprimir nossas tradições socialistas na construção da UNE, do movimento estudantil brasileiro e do bloco histórico da revolução democrática.

* Clarissa Alves da Cunha, vice-presidenta da UNE
Estevão Cruz, diretor de Políticas Educacionais da UNE
Mitã Chalfun, vice-presidente da UEE-RJ
Mirelly Cardoso, vice-presidenta Zona da Mata da UEE-MG

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