No próximo dia 15, a Venezuela irá escolher se permanece sendo governada por Hugo Chávez ou se serão convocadas novas eleições. Depois de uma batalha campal recheada de suspeições para conseguir as assinaturas que convocaram o plebiscito, a oposição tenta a todo custo derrubar o presidente. Os movimentos populares, no entanto, estão organizados para garantir a vitória do Não e a conseqüente permanência de Chávez.
Venezuela decide o futuro de Chávez
Você está de acordo em deixar sem efeito o mandato popular outorgado mediante eleições democráticas legítimas ao cidadão Hugo Rafael Chávez Frias como presidente da República Bolivariana da Venezuela para o atual período presidencial? Essa é a pergunta a ser respondida pelos 12,5 milhões de eleitores que participam no próximo dia 15 do referendo que decidirá sobre a continuidade ou não do governo Chávez.
Entre o “Sí” e o “No” há a história de um governante que resolveu enfrentar as elites do país, alimentadas pela indústria petrolífera, responsável por mais de 80% das exportações venezuelanas. O processo de crise começou no final de 2001, quando foram aprovadas diversas medidas populares, por meio de 49 leis garantindo a reforma agrária, a lei petroleira e a lei da pesca. Em março de 2002, os opositores chegaram a tirar Chávez do poder, mas foram surpreendidos por um contra golpe. No início de 2003, um locaute por parte dos empresários tentou novamente enfraquecer o governo.
Divergências sindicais
Naquele momento um dos principais incentivadores do golpe foi a reacionária e burocrática CTV, central sindical que se beneficiava da pouca liberdade sindical no país. A situação agora é outra. Em 2003 surgiu a União Nacional dos Trabalhadores (UNT). Com pouco mais de um ano de existência, a UNT conseguiu reorganizar a esquerda trabalhadora, com a adesão de 500 sindicatos e 37 federações regionais, inclusive das duas maiores entidades representativas da categoria dos petroleiros (Fedepetrol e Sinutrapetrol).
Segundo S. P. Borges, Coordenador Nacional da UNT, o crescimento da central foi além da própria capacidade dos dirigentes. “Foram os trabalhadores que deram a força que tem hoje a Central”. Borges afirma que a UNT espera uma vitória contundente do “No” no dia 15 de agosto. Ele lembra que com Chávez o setor sindical conquistou liberdades pelas quais batalhava há 43 anos. O coordenador da central reforça ainda os avanços do chamado processo bolivariano, que representa mais do que as medidas populares de Chávez, mas um processo cultural de reavivar as referências populares e de resistência da Venezuela.
A mítica em torno de figuras símbolo, aliás, está presente em todo o debate. Os comandos de Chávez levam o nome de Maisanta, codinome de seu bisavô que guerreou contra ditadura de Juan Vicente Gómez (1908-1935). O presidente pediu a seus seguidores para organizar patrulhas de dez ativistas cada uma e realizar a “Misión Florentino”, figura mítica de um cantador que enfrentou o Diabo segundo um poema popular cantado em festas das planícies venezuelanas.
O próprio site da presidência da Venezuela descreve a Missão Florentino como sendo a “missão que guia a ação revolucionária,orientada a assegurar o triunfo eleitoral no referendo nacional de 15 de agosto de 2004,quando se reeditará (de acordo com o imaginário coletivo do povo venezuelano) a derrota da oligarquia nacional e estrangeira pelo povo soberano na Batalha de Santa Inês,magistralmente dirigida pelo General Ezequiel Zamora ”
As condições do embate
A oposição ao presidente une setores da classe média e da burguesia, mas não tem um líder que a una. Ela aposta suas fichas no discurso contra desemprego – que atinge 17% da população economicamente ativa – e a insegurança, alegando que Chávez desuniu o país. Nos últimos meses, porém, as manifestações populares fizeram que a oposição perdesse apoio na classe média, que em parte voltou a se incorporar ao processo bolivariano.
A previsão para o resultado do referendo é incerta. Nas eleições de 2000, Chávez teve quase 60% dos votos. Agora, para que a oposição consiga tirar Chávez é preciso que o “Sí” tenha mais votos que os 3.757.773 obtidos por ele em 2000, e que obviamente haja mais votos pelo “Sí” do que pelo “No”. A presença nas urnas não é obrigatória, e analistas dizem que a abstenção pode alcançar 25%.
O que virá depois do referendo é difícil de prever. Chávez já anunciou que quer ver respeitado o resultado do referendo, seja ele qual for. Não se sabe se será bem assim. Os movimentos populares já afirmaram que não aceitarão fraudes, e que se passar o “Sí” haverá manifestações em todo o país. No caso de vitória, Chávez já afirmou que gostaria de constituir um governo de unidade nacional. Para Borges, certamente haverá enfrentamentos, já que “a burguesia não toleraria as medidas populares”.
Para a UNT, inclusive, nem tudo são flores na política chavista. Segundo Borges, há diretores de ministérios e prefeitos que vêm fazendo uma política contra o operariado, com desrespeito aos sindicatos e demissões coletivas. “Não queremos jogar peso nessas questões agora para não corrermos o risco de enfraquecer Chávez, mas é um debate que terá que ser feito”. Até o dia 15, a união dos setores populares é para garantir a vitória do “No”. As diferenças ficam para depois.
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