Em entrevistas à Record e à Globo, presidente afirma que Brasil responderá a sobretaxas impostas por Trump, critica interferência americana no julgamento de Bolsonaro e classifica carta do extremista como “inadmissível”.

O presidente Lula voltou a fazer uma defesa contundente da soberania brasileira e garantiu que o governo não irá aceitar decisões unilaterais vindas dos Estados Unidos, a exemplo do anúncio pelo presidente Donald Trump de que irá taxar os produtos do Brasil em 50%. Em duas entrevistas exibidas na noite desta quinta-feira (10), ao Jornal da Record e ao Jornal Nacional, Lula reafirmou que o Brasil tomará as medidas cabíveis em resposta ao que já é considerado o maior ataque ao país da história recente.
“Só respeite o povo brasileiro. Na minha vida, quem decide as coisas é o povo. Eu sou brasileiro, gosto do Brasil e não desisto nunca”, afirmou Lula, na entrevista para a Record. “Na questão da soberania, queremos que ele [Trump] respeite o Brasil”.
“O que mais vai valer é o seguinte: nós temos a Lei da Reciprocidade, que foi aprovada no Congresso Nacional”, lembrou Lula, na conversa com jornalista Cristina Lemos, da Record. “E não tenha dúvida que, primeiro, nós vamos tentar negociar. Mas se não tiver negociação, a lei da reciprocidade será colocada em prática. Se ele vai cobrar 50 de nós, nós vamos cobrar 50 deles”, assegurou o presidente.
À Delis Ortiz, da Globo, Lula também confirmou que o Brasil deverá recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC). “O Brasil vai tentar junto com a OMC, com outros países, tentar fazer com que a OMC tome uma posição para saber quem é que está certo ou que está errado”, pontuou. “A partir daí, se não houver solução, nós vamos entrar com a reciprocidade já a partir de primeiro de agosto quando ele começa a taxar o Brasil”, disse o presidente.
Ouça a íntegra das entrevistas na Rádio PT:
Carta de Trump é “inadmissível”
Ele classificou a carta enviada pelo mandatário americano como inadmissível. “É inaceitável que o presidente Trump mande uma carta, sabe, pelo site dele, e começa dizendo que é preciso acabar com a caça as bruxas. Isso é inadmissível. Primeiro, porque isso aqui tem Justiça e a gente está fazendo um processo com direito a presunção de inocência de quem é vítima. Se cometeu um erro vai ser punido. Aqui no Brasil é punido”, disse o presidente, em referência ao julgamento de Jair Bolsonaro.
Lula lembrou ainda que Trump faltou com a verdade ao tratar as relações comerciais entre Brasil e Estados Unidos como injustas aos americanos. “É inverosímil o fato pelo qual você aumentou a tarifa”, disse, referindo-se à Trump. “O presidente Trump deve estar muito mal informado porque nos últimos 15 anos, o déficit para o Brasil é de US$ 410 bilhões de reais”, destacou o líder brasileiro.
Mais cedo, Lula também havia abordado a questão com Lemos: “Será que a assessoria dele não tem, sabe, sabedoria de explicar para ele não fazer uma afronta dessa a um outro país?”, indagou Lula à jornalista da Record.
Lula reafirmou que o Brasil sempre priorizou o diálogo nas relações com todos países, sejam do Norte ou do Sul Global. “Nós entendemos que o Brasil é um país que não tem contencioso com ninguém, nós não queremos brigar com ninguém, nós queremos negociar e o que nós queremos é que sejam respeitadas as decisões brasileiras”, observou.
Julgamento de Bolsonaro
Às duas emissoras, Lula defendeu o papel independente do Judiciário brasileiro no julgamento de Bolsonaro e rechaçou interferência de quem quer que seja no funcionamento das instituições brasileiras. “O ex-presidente [Bolsonaro] deveria assumir a responsabilidade porque ele está concordando com a taxação do Brasil”, destacou o presidente, à Record.
“Aliás, foi o filho dele que foi lá fazer a cabeça do Trump, que começa uma carta tentando fazer um julgamento de um processo que está na mão da Suprema Corte. É um processo que não tem julgamento político não, se nos autos dizer que a pessoa errou, será condenado. É assim que é o Brasil”.
À Globo, Lula também abordou o assunto, afirmando que Trump não pode dar palpite na decisão judicial de um país. “O que o presidente Trump tem que saber é que se aqui no Brasil ele tivesse feito o que ele fez, sabe, nos Estados Unidos com as eleições, ele também estaria sendo processado, estaria sendo julgado e se fosse culpado, ele seria preso”, argumentou. “É assim que funciona a lei para todos no mundo. Ou seja, nós precisamos aprender a respeitar. Você nunca viu me meter numa decisão de justiça americana. Nunca viu”.
BRICS
Lula reiterou o papel do BRICS na construção de um mundo multipolar e voltou a defender a não utilização do dólar nas transições comerciais entre os países do bloco. “As coisas vão continuar melhorando e nós estamos discutindo inclusive a possibilidade de ter uma moeda própria, ou quem sabe com as moedas de cada país a gente fazer comércio sem precisar usar o dólar. Porque nós não temos a máquina de rodar dólar, só os EUA que têm. Nós não precisamos disso para fazer comércio exterior”, disse ao JN.
“Agora, achar que os BRICS é a razão pela qual o Trump ficou nervoso, o Brasil nunca ficou nervoso com a participação do G7, o Brasil nunca ficou nervoso com as coisas que o Estados Unidos faz”, justificou. Cada país tem soberania de fazer aquilo que quer. Então eu penso que o presidente Trump precisa se cercar de pessoas que o informem corretamente”.
Via pt.org.br