Por Ubiratan de Souza, na Carta Maior *
A Presidenta Dilma Rousseff, respondendo às vozes que vêm das ruas foi extremamente feliz, mostrou a sua sensibilidade política e capacidade de iniciativa, ao anunciar um conjunto de medidas que vai desde a reforma política, mobilidade urbana, educação até a saúde.
No caso da saúde, com o Programa Mais Médicos, mais formação com cursos de medicina, mais hospitais e unidades de saúde, a Presidenta Dilma teve a coragem política e a marca da inovação transformadora de iniciar mudanças estruturais com resultados a curto, médio e longo prazos no atendimento da saúde pública do povo brasileiro. Chamou primeiro os médicos brasileiros para trabalharem na atenção básica e atuarem exclusivamente no SUS – na periferia de grandes cidades, municípios do interior e regiões norte e nordeste, com salário de R$ 10 mil, mais ajuda de custo (alimentação e auxílio-moradia) – e só depois que os médicos brasileiros não preencheram todas as vagas, chamou os médicos estrangeiros.
Qual é a realidade do atendimento dos médicos no Brasil hoje? Não tem nenhum médico em cerca de 700 municípios e, mesmo onde existe, o número é incuficite. Veja os números abaixo.
Relação médicos/mil habitantes:
– Brasil 1,8
– Cuba 6,7
– Espanha 4
– Portugal 3,9
– Uruguai 3,7
– Argentina 3,2
– Alemanha 3,6
– Itália 3,5
– Inglaterra 2,7
Percentual de médicos que se graduaram no exterior:
– Inglaterra 37 % – EUA 25 % – Brasil 1,79%.
Distribuição dos médicos no país:
– a maior concentração é percebida nas regiões Sul (RS 2,23) e Sudeste (SP 2,49 – RJ 3,44);
– 22 estados estão abaixo da média nacional, que é de 1,8 médicos por mil habitantes;
– entre os piores estão cinco estados: AC, AP, MA, PA e PI, que possuem uma média de menos de 1 médico por mil habitantes.
O déficit atual de médicos no país é de 54 mil (dados Ministério da Saúde).
Por tudo isso, a proposta de trazer médicos estrangeiros de Cuba, Espanha, Portugal, Argentina, entre outros – que falam espanhol e português – e só depois que os médicos brasileiros não preencherem todas as vagas, está legitimada do ponto de vista político, técnico e da solidariedade humana.
Sobre a vinda dos médicos cubanos, que têm recebido críticas preconceituosas e ideológicas dos setores conservadores, que visam o lucro no atendimento da saúde do nosso povo, veremos que essas manifestações não procedem e que os médicos cubanos têm muito a contribuírem com sua experiência na atenção básica da saúde com programas, como o médico de família, e avanços extraordinários na área da biotecnologia. Só para se ter uma ideia, em Cuba a mortalidade infantil é de 4,6 por mil nascimentos, nos Estados Unidos é 6,81 e no Brasil 15,6 (dados de 2012 da OMS).
Cabe destacar que o governo brasileiro, firmou um termo de cooperação com a Organização Pan-Americana de Saúde/Nações Unidas (Opas) para contratar coletivamente quatro mil médicos cubanos para atuar no Brasil. Na primeira etapa do convênio, segundo o Ministro da Saúde Alexandre Padilha, os 400 médicos cubanos que já chegaram ao país vão atuar nos 701 municípios que não foram escolhidos por nenhum profissional brasileiro ou estrangeiro. Desses 701 municípios, 84 % ficam nas regiões Norte e Nordeste.
Quais as razões daqueles que criticam, sem argumentos factíveis, a vinda dos médicos cubanos? Na verdade temem é a tradição humanitária dos médicos cubanos, que teve início em 1963, quando Cuba enviou à nascente República da Argélia (que tinha se libertado do colonialismo francês), sua primeira missão médica humanitária e de solidariedade internacional. Até hoje, os médicos cubanos já atuaram em redes de cooperação humanitária em 102 países. Hoje são 37 mil médicos cubanos colaboradores que oferecem seus serviços em 70 países do terceiro mundo (dados do professor Salim Lamrani–doutor em estudos ibéricos e latino-americanos da Universidade Paris Sorbonne – Paris IV).
Uma das primeiras declarações, que ilustra bem esta tradição humanitária e de solidariedade internacionalista, de médicos cubanos na imprensa brasileira foi “viemos por solidariedade e não por dinheiro – nós somos médicos por vocação e não por dinheiro – trabalhamos porque nossa ajuda foi solicitada, e não por salário, nem no Brasil nem em nenhum lugar do Mundo”, médico Nelson Rodrigues.
Um outro exemplo, é o caso dos 18 mil médicos cubanos que atuam na Venezuela, desde do final de 2002, no chamado Programa Bairro a Dentro. No primeiro nível do programa, um médico atua no atendimento a 250 famílias. O médico atende pela manhã no consultório e à tarde faz visitas a domicílio. O médico faz um censo e elabora um diagnóstico das famílias, traçando um plano de trabalho.
Conta com um espaço físico para funcionar o consultório e uma pequena farmácia. O projeto Bairro à Dentro, conta também com programas complementares de alimentação, que são acessados pela comunidade por indicação do médico de família: bolsa família (famílias em situação de miséria); máxima proteção (bolsa alimentação com subsídios de 50 %) e comedores populares. O programa é complementado no nível 2 por uma clínica popular (similar a uma Unidade de Saúde) e no nível 3 por hospital.
Por último, é preciso destacar que o Programa Mais Médicos vem acompanhado com mais cursos de medicina, com investimentos da ordem de R$ 7,4 bilhões em mais hospitais, UPAs e Unidades Básicas de Saúde, que levarão, no médio prazo, à contratação de mais enfermeiros (as) e profissionais de saúde. Este programa tem o mérito de colocar na ordem do dia a prioridade de uma política de saúde que tem como porta de entrada do SUS a atenção primária resolutiva, atacando um dos gargalos da saúde pública no Brasil. A população brasileira já deu mostras que apoia este Programa, que vai ter um papel transformador da realidade atual e ajudar a criar uma nova cultura humanitária e de solidariedade no atendimento da saúde pública no nosso país.
* Ubiratan de Souza é economista e um dos divulgadores da experiência, implantação e desenvolvimento do Orçamento Participativo no Brasil e no Exterior.
Comente com o Facebook