ara essas pessoas que não se dispuseram a sair de sua zona de conforto por um dia sequer e ficaram indignadas por passar alguns minutos a mais no trânsito, respondo com uma flor. Respondo com a primeira flor, Margarida Maria Alves, camponesa e presidenta do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alagoa Grande, Paraíba, brutalmente assassinada em agosto de 1983, por lutar pela reforma agrária, pelo fim do analfabetismo e pela dignidade de homens e mulheres do campo. Respondo com o jardim de Margaridas nascidas dessa semente.
A Marcha das Margaridas é a maior manifestação de mulheres da América Latina. Organizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), federações, sindicatos, e apoiada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), pela Marcha Mundial das Mulheres e pela Articulação das Mulheres Brasileiras, a quarta edição das margaridas tem como objetivo defender uma extensa pauta de reivindicações, como o desenvolvimento sustentável do campo, mais crédito para as trabalhadoras rurais, o limite do tamanho das propriedades e a criação de reservas extrativistas (esse último item no bojo das discussões do Código Florestal).
As Margaridas também vieram para repudiar a violência no campo e a violência contra as mulheres. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) registrou o assassinato de 1.580 pessoas entre os anos de 1985 e 2010 em todo o país. Destes, somente 91 casos foram a julgamento, com a condenação de apenas 21 mandantes e 73 executores. Em relação à ameaça de morte no campo, a CPT contabilizou 1.855 pessoas ameaçadas de 2000 a 2011: 207 foram ameaçadas mais de uma vez, 42 foram assassinadas e mais 30 sofreram tentativas de assassinato. Também no período de 2000 a 2011 passou de 7% a 20% o índice de mulheres na lista de ativistas campesinos ameaçados.
A caminhada das Margaridas definitivamente não se resume aos 6 quilômetros que separam o Parque da Cidade do Congresso Nacional. É o chão sem fim que acolhe os passos de lutadoras anônimas. É a longa caminhada de quem esteve na estrada por mais de um ano nas atividades preparatórias e de formação nos nossos 26 estados e no Distrito Federal, na construção dessa linda mobilização. Tomo emprestado trecho que li em matéria do sítio eletrônico Carta Maior que, a meu ver, mais do que números, estatísticas e discursos, melhor sintetiza a grandeza do acontecimento:
“Para conseguir viabilizar a ida à manifestação em longas viagens de ônibus e sobreviver durante um tempo longe de casa, mulheres de diversos estados tiveram de se virar e apelar à criatividade, para arrumar dinheiro. ‘Uma mulher me disse: ‘eu tinha uma galinha e uma pata. Rifei a pata e consegui 70 reais’, conta Conceição Dantas, do Centro Feminista 8 de Março do Rio Grande do Norte, organização que faz parte da coordenação da Marcha Mundial de Mulheres.
‘Para nós, é até difícil explicar como é importante esse processo. Porque é dar responsabilidade às mulheres de organizarem a sua vinda. Elas têm que conquistar isso. Se o seu grupo não consegue mobilizar e conscientizar as mulheres e buscar os recursos, elas não conseguem vir. Assim, transformam dificuldades pessoais em desafios coletivos”, explica a potiguar.” (extraído de “Margaridas viajam até um ano para participar de marcha em Brasília, publicada na Agência Carta Maior.)
Pergunto então: perto de caminhadas de vidas inteiras, o que representam alguns minutos de intolerância?
Em tempo: ontem, 16 de agosto, o Governador Agnelo recepcionou as caravanas da marcha e eu também passei pela Cidade das Margaridas para dar as boas-vindas para as bravas mulheres. A Presidenta Dilma participa hoje, 17 de agosto, do encerramento da Marcha no Parque da Cidade.
Arlete Sampaio é Secretária de Estado de Desenvolvimento Social e Transferência de Renda – SEDEST, Presidenta do Fórum Nacional de Secretários de Estado de Assistência Social – FONSEAS e Deputada Distrital (PT/DF) licenciada.
Comente com o Facebook