Em 29 de maio ocorreu o aniversário de 77 anos de nascimento de Maurice Bishop. Hoje, se recorda o legado deste jovem descendente de escravo, advogado de profissão e militante anticolonialista que, em uma pequena ilha de 360 quilômetros quadrados e 80 mil habitantes, a partir de 1979 liderou um revolução que trilhou os caminhos de mudanças democráticas, anti-imperialistas e anticapitalistas.
Granada
Granada é uma ilha no sudeste do mar do Caribe. Abrange um número de ilhas periféricas menores, as duas povoadas sendo Carriacou e Petite Martinique. A população é relativamente pequena – apenas cerca de 110 mil habitantes – e não era muito menor durante a revolução.
Granada trocou de mãos entre franceses e britânicos desde sua primeira colonização em 1654. A produção de açúcar passou a dominar a ilha, através do uso do trabalho escravo, até o início de 1800. A escravidão foi abolida na década de 1830 devido à sua falta de rentabilidade quanto, as revoltas de escravos que abalaram as Índias Ocidentais.
A Trajetória de Bishop
Maurice Bishop nasceu em 29 de maio de 1944 em Granada, colônia britânica no Caribe que em 1974 adquiriu sua independência.
A luta contra a opressão e o racismo em Granda faz parte da história da Ilha, tendo principiado com as revoltas de escravos e, com greves e mobilizações das quais vale mencionar a primeira greve geral ocorrida em fevereiro de 1951. Bishop soma-se a essa tradição de resistência popular na militância no movimento estudantil secundarista, fundando Assembleia da Juventude de Granada pela Verdade.
Em 1963, ingressou no curso de direito da London University, formando-se em 1966. Tornou-se, então, presidente da sociedade dos estudantes das Índias Ocidentais, ativista da Campanha Contra a Discriminação Racial (CCDR) e cofundador de um escritório de ajuda legal às comunidades das Índias Ocidentais em Notthing Hill.
Bishop voltou a Granada em 1970, após curto período em Trinidad e Tobago, passando a atuar no movimento popular contra o governo de Eric Matthew Gairy.
Em Granada Bishop participou da fundação do grupo Fórum, que reuniu a intelectualidade caribenha associada aos movimentos anti racistas e socialistas. Fundou o movimento popular conhecido como Jewel (sigla em inglês de Esforço Conjunto pelo Bem-Estar, Educação e Libertação) e do Movimento pelas Assembleias do Povo (MAP), que, em 1972, se fundiriam, transformando-se num partido político, o Novo Movimento Jewel (NMJ).
Preocupado com as intenções de Gairy de utilizar os planos de independência da Grã-Bretanha para implantar uma ditadura militar, Bishop organizou a marcha de protestos que culminou no domingo sangrento, de 21 de junho de 1974, quando seu pai foi morto.
Nas eleições de 1976, vencidas por Gairy sob fortes suspeitas de fraude, tornou-se o principal líder da oposição.
Em 1979 uma revolta popular põe fim ao governo antipopular e repressivo de Gairy e, em 13 de março é proclamado o Governo Popular Revolucionário, sendo Bishop nomeado Primeiro-Ministro.
O Governo Popular Revolucionário se orientava pela realização da transição ao socialismo tendo Implantado um regime de economia mista, enfatizando os investimentos estratégicos do Estado em infraestrutura e um papel complementar para os investimentos privados. Com ajuda técnica e financeira cubana, e em parceria com empresas multinacionais, iniciou a construção de um aeroporto, para incrementar o turismo.
Segue, ainda que de forma sintética, notícias das principais iniciativas da Revolução liderada por Bishop.
Revolução e Democracia Popular
O Governo Popular Revolucionário substituiu o modelo liberal-burguês de democracia representativa por um modelo de democracia com participação popular o qual chegou a contar com a presença de 80% da população, estruturado através de conselhos de aldeia e zona.
Os projetos de lei começam a ser apresentados ao povo antes de serem sancionados, enquanto todas as normas repressivas e ditatoriais impostas por Gairy foram revogadas.
A Política externa do Governo Revolucionário
O Governo Revolucionário orientou-se, no plano internacional, pelo engajamento ativo com movimentos revolucionários da América Latina, África e Ásia, adesão ao Movimento dos Não-Alinhados (NAM) e o fortalecimento de relações de cooperação com Cuba e a URSS.
Alfabetização, Educação Pública e Gratuita
Antes de 1979 representava o ensino era privatizado e o analfabetismo atingia 90% da população. Daí que a alfabetização e o acesso amplo e gratuito à formação educacional fossem as primeiras prioridades do Governo. A partir de julho de 1981, com a colaboração pedagógica cubana, o nível de alfabetização atingiu 98% da população e o número das escolas secundárias foi triplicado. E passou a existir um forte programa de envio de estudantes bolsistas para o exterior.
Redução do Desemprego
O desemprego em Granada era de 49% antes de 1979. Em apenas dois anos e meio do governo revolucionário as taxas de desemprego foram reduzidas para 12%.
Direito de Organização dos Trabalhadores e Trabalhadoras
O Governo Revolucionário revogou a legislação antisindical e consagrou em lei o direito de sindicalização de todos os trabalhadores. Garantiu assim a liberdade de associação das classes trabalhadoras.
Durante a Revolução, os trabalhadores e trabalhadoras participaram junto na elaboração do orçamento da Nação e passaram a receber um terço dos lucros empresariais.
Luta Contra Opressão das Mulheres
O Governo Revolucionário instituiu uma série de medidas destinadas a combater a opressão das mulheres tendo sido criadas pré-escolas e creches, licença maternidade, suprimida a desigualdade salarial e abolidas todas as formas legais de discriminação de gênero.
Desenvolvimento Agroindustrial
Após 450 anos de colonialismo e neocolonialismo, a Revolução inaugurou a primeira planta agroindustrial no país. A pesca era a base essencial da indústria, razão pela qual a frota pesqueira nacional foi desenvolvida para fornecer alimentos à população.
Reforma Agrária
O Governo Revolucionário criou a Comissão de Reforma Agrária que foi criada com base no princípio de que a terra é de quem a trabalha, a fim de eliminar qualquer vestígio de latifúndio. Assim, os camponeses se organizaram em cooperativas e aumentaram a produção nacional.
Sistema de Saúde Apoiado por Cuba
O Governo Revolucionário destinou 14% do orçamento para gastos com saúde, tornando-o um dos mais altos da Commonwealth no Caribe. Com o apoio da colaboração médica cubana, Granada desenvolveu um sistema de atenção primária à saúde para toda a cidade e, ao mesmo tempo, enviou estudantes para estudar medicina em Cuba.
Telecomunicações
Em 1982, o único sistema telefônico em Granada foi nacionalizado e acordos de cooperação foram assinados com a República Democrática Alemã para melhorar o serviço telefônico.
Aeroporto Internacional
Em Punta Salinas, a leste de Granada, foi desenvolvido com apoio de Cuba o projeto de um novo aeroporto internacional civil. Com essa obra de 1.500 metros e capacidade para operação de aeronaves de pequeno e grande porte, o potencial turístico do território nacional seria mostrado ao mundo. Participaram do projeto 350 granadinos e 250 cubanos.
Golpe de Estado, Invasão Imperialista e Assassinato de Bishop
Em 1983, no marco da ofensiva imperialista de Reagan, a ousadia do povo de Granada foi punida com um golpe militar que abriu as portas à invasão da ilha por tropas norte-americanas.
Em outubro de 1983, ao regressar de uma visita diplomática à Checoslováquia e Hungria, Bishop foi deposto pelos partidários do vice-primeiro-ministro Bernard Coard, seu antigo companheiro, e posto em prisão domiciliar.
Em resposta ao golpe, uma revolta popular obtém a liberdade de Bishop e outros dirigentes do Governo Revolucionário. No entanto, são posteriormente recapturados e, para impedir uma nova libertação o governo de Bernard Coar ordenou a execução dos presos na base militar de Fort Rupert. Maurice Bishop foi fuzilado em 19 de outubro de 1983, junto com a sua companheira e ministra da Educação do seu governo, Jacqueline Creft e vários outros membros do Governo Revolucionário.
A pretexto de que a construção do aeroporto internacional significaria a construção de um “enclave militar da URSS” poucos dias depois do assassinato de Bisshop forças armadas norte-americanas com apoio de tropas de Aruba, Barbados, Dominica, Jamaica, Santa Lúcia e São Vicente invadiram Granada. Participaram da invasão o 1º e 2º batalhões do 75º Regimento de Rangers, 82º Regimento Aéreo e mais a força de destacamento rápido do Exército dos Estados Unidos, além de Fuzileiros Navais, Delta Force, SEALs e forças auxiliares, totalizando 7.600 soldados.
A operação militar custou a vida a 70 granadinos, 25 construtores cubanos e feriu outros 358 granadinos e 59 cubanos. Houve bombardeios sobre a população civil, inclusive a um hospital psiquiátrico. Não foi encontrado nenhum assessor militar cubano ou soviético.
Como resultado do golpe e da invasão foi estabelecida a censura à imprensa, restringida a liberdade de expressão e suspenso o direito de habeas corpus. As convenções internacionais sobre o tratamento de prisioneiros de guerra foram violadas.
Os EUA instalaram um governo sob suas ordens exercido inicialmente por Paul Scon e, posteriormente, por Nicholas Braithwaite, que durou até 4 de dezembro de 1984. Este rompeu as relações diplomáticas com Cuba e a URSS e realizou uma contrarrevolução que instaurou uma economia neoliberal.
O Legado de Maurice Bishop
A Revolução Granadina e o legado de Maurice Bishop, assim como a Revolução Haitiana de Toussaint Louverture, integram os séculos de resistência índia, negra e popular no qual forjamos uma tradição anticolonial, antirracista e libertária. Nessa senda, de mãos dadas com Bishop seguimos e venceremos.
Saiba mais
MANIFESTO DO MOVIMENTO NEW JEWEL
https://www.marxists.org/history/grenada/1973/manifesto.htm
DISCURSO DE MAURICE BISHOP NA 34ª ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS
https://www.marxists.org/history/grenada/1979/bishop-united-nations.htm
DISCURSO DO COMANDANTE FIDEL CASTRO SOBRE A INVASÃO DE GRANADA:
http://www.cuba.cu/gobierno/discursos/1983/esp/f141183e.html
MAURICE BISHOP, EL VISIONARIO NACIONALISTA DE GRANADA
- Lucio Costa é da Coordenação Nacional da Democracia Socialista
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