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Na Venezuela, Assembleia Internacional dos Povos debate internacionalismo e a luta anti-imperialista

Por Marcelo Fragozo

 

Mais de 400 dirigentes de organizações populares, partidárias e sindicais, intelectuais, jovens e mulheres de 85 países dos cinco continentes estão reunidos desde o domingo (24) em Caracas, na Venezuela, para participar da Assembleia Internacional dos Povos.

A atividade acontece justamente no momento da mais intensa ofensiva dos Estados Unidos e seus aliados na região sobre a soberania venezuelana. Por isso a Assembleia se coloca, desde o seu princípio, como mais um ato de solidariedade à revolução bolivariana e contra o imperialismo.

A companheira Nalu Faria, integra a delegação brasileira presente ao encontro representando a Marcha Mundial das Mulheres e os movimentos populares do Brasil. Nalu é histórica militante feminista e faz parte da Coordenação Nacional da Democracia Socialista, tendência do Partido dos Trabalhadores – PT.

 

Militantes empunham faixa da Assembleia Internacional dos Povos durante a Marcha em defesa da Revolução Bolivariana no último sábado (23) em Caracas.

 

Ela nos conta que já no sábado (23) as delegações participaram, em Caracas, de uma Grande Marcha em defesa da revolução bolivariana. A data foi importante porque foi aquela definida pelos Estados Unidos como limite para entrada da suposta “ajuda humanitária” pelas fronteiras do Brasil e da Colômbia. Embora a situação nesses locais, principalmente na fronteira com a Colômbia, tenha sido bastante complicada, “o que se percebe no diálogo com as pessoas e pelas informações que chegam a capital é de que são processos isolados e montados nesses locais. Não se espalha pelo resto do país nenhuma articulação e nenhum apoio significativo a Guaidó”, afirma Nalu.

Nalu nos diz ainda que a assembleia conta com uma “representação bastante ampla da África, do mundo árabe, da Asia, tem pessoas da da Europa e com certeza uma maior representação aqui da América Latina e do Caribe e também dos Estados Unidos.” Ela afirma que o público “tem uma composição de muita juventude e é muito amplo quanto ao tipos de movimentos (partidos, sindicatos, movimentos em torno a várias pautas)”. Para ela todos estão muito comprometidos com o “sentido de fazer da assembleia um processo de articulação internacional dos movimentos, dos povos e dos lutadores com essa caráter de construção do internacionalismo.”

A Assembleia iniciou com um debate de conjuntura, com destaque para a situação venezuelana e contou com a participação da Vice-Presidenta,  Delcy Rodríguez e da Prefeita de Caracas, Érika Farías. Em seguida João Pedro Stedile (MST/Via Campesina) esclareceu os objetivos da articulação em torno da AIP, que envolve organizações de mais de 130 países de todo o mundo. “Aprendemos, com o intercâmbio que fizemos para construir esse processo internacional, que compartilhamos sonhos com todos os que estão aqui. Precisamos construir unidade através de uma reforma programática, e o estamos fazendo muito bem. Todas as formas nas quais o povo se organiza são importantes, seja associações, movimentos, partidos, sindicatos, igrejas”, ressaltou o dirigente brasileiro.

Na sequencia da programação deverão ocorrer diálogos entre as regiões sobre ações de solidariedade e sobre as iniciativas em torno dos objetivos internacionalistas da Assembleia no médio prazo e levarão a construção de um calendário comum.

 

 

Mas, afinal, o que acontece na Venezuela?

A situação da Venezuela é muito complexa, e para começar o debate precisamos questionar a narrativa construída e consolidada dos meios de comunicação hegemônicos, que repetem distorções, desinformações e mentiras traduzidas a diversos idiomas, todos os dias e mundo afora. As fontes de informação que usamos neste texto vem de meios de comunicação alternativos e populares, tais como a ALBA TVBrasil de FatoTelesurDemocracy Now, e dos movimentos feministas.

A Venezuela tem muito petróleo e muito minério. As empresas transnacionais, originais dos EUA, Canadá e outros países do Norte tem muito interesse em controlar esse país, colocando no governo um fulano totalmente submisso aos interesses do capital estrangeiro e do imperialismo estadunidense. Mas além disso, a Venezuela está sob ataque pelo que a revolução bolivariana significa politicamente para a América Latina e Caribe.

Há 20 anos a Venezuela vive um período histórico de transformação social, baseado em políticas de redistribuição e na construção de poder popular. A Venezuela mudou, e parte dessas mudanças tem alteraram as condições de vida, direitos e participação política das mulheres, uma força social fundamental para o processo bolivariano. Como todo processo de transformação, há desafios gigantes e contradições. E como todo processo que afirma princípios, valores e horizontes anti-capitalistas, de soberania popular, com capacidade de seguir adiante e aprofundar as mudanças, ao longo desses 20 anos é alvo de ataques, tentativas de golpe e, mais recentemente, de muita violência.

Na guerra econômica, convergem as sanções externas (dos EUA, Canadá e União Europeia), e o boicote de setores produtivos internos. Soma-se a isso a depreciação da moeda venezuelana, cuja economia depende do preço do petróleo. A hiperinflação e a crise de abastecimento são constantes e se agudizam, o que impacta drasticamente as condições de vida da população.

Processos de desestabilização interna, com violência e sabotagens, tem sido financiados há anos por recursos estrangeiros. Soma-se a isso a estratégia de desinformação e fake news que tem sido mobilizada pela oposição de extrema direita na Venezuela.

Desde janeiro, buscam deslegitimar a eleição de Nicolás Maduro, com a auto-proclamação de Juan Guaidó como presidente. É preciso lembrar que as eleições aconteceram de forma legítima, nos termos da constituição da Venezuela, e inclusive com acompanhamento e reconhecimento de observadores internacionais. As eleições aconteceram em maio do ano passado e sua realização foi resultado de um processo de negociação com a oposição, mas mesmo assim, a oposição mais à direita não se apresentou nas eleições. Essa iniciativa de auto-proclamação como presidente não tem respaldo constitucional na Venezuela, e o que tenta operar é um governo paralelo. Os governos alinhados com os EUA, como de Jair Bolsonaro no Brasil, fazem parte da encenação golpista, pretendendo reconhecer pessoas indicadas por Guaidó como representantes da Venezuela.

Nesses dias, a movimentação imperialista é em torno do envio de uma chamada “ajuda humanitária”, mobilizada pelos Estados Unidos, com apoio especialmente de Jair Bolsonaro no Brasil e Iván Duque na Colômbia. Essa iniciativa reforça a narrativa da intervenção externa e pretende impulsionar conflitos nas fronteiras terrestres e marítimas. É preciso dizer que várias organizações que historicamente atuam com ajuda humanitária se recusaram a apoiar essa ação dos Estados Unidos por considerar que os interesses políticos estão explícitos, o que descaracteriza a ação humanitária. Tem sido comum escutar que, se os Estados Unidos realmente se preocupassem com a dignidade humana e as condições básicas de vida do povo venezuelano, deveria suspender as sanções, boicotes e bloqueios. E é sempre bom lembrar que os EUA tem uma experiência histórica de se meter em questões internas dos países (inclusive com invasões e conflitos bélicos) usando o envio de “ajuda humanitária”, que além de tudo ainda impacta na soberania alimentar.

Frente a crise vivida e sentida pela população venezuelana, se visibiliza um sintoma que é a migração massiva de venezuelanos e venezuelanas para os países da América Latina. É preciso visibilizar também todo o esforço necessário para enfrentar a crise que impacta o cotidiano e dificulta a satisfação das necessidades do povo que vive e trabalha na Venezuela. E são as mulheres que estão a frente do trabalho voluntário, da energia e do esforço necessário para garantir a sustentabilidade da vida. Como mostra um relatório sobre as condições de vida das mulheres venezuelanas, a distribuição de alimentos subsidiados é viabilizada por uma quantidade grande de mulheres que se envolvem para garantir sua execução.

As tensões sobre o presente e o futuro da Venezuela aumentam a cada dia, com uma escalada de violência evidente. Em defesa do governo de Nicolás Maduro e da soberania da Venezuela, há um respaldo importante das Forças Armadas Nacionais Bolivarianas, que os EUA não cansam de tentar minar. São reconhecidas as implicações e proporções internacionais que uma agressão militar explícita na Venezuela poderiam gerar. Aliás, toda essa disputa em torno do destino da Venezuela está imersa nas disputas geopolíticas no contexto de crise internacional, rearranjo de forças, disputas entre potências econômicas e militares.

São muitas as formas que os conflitos armados podem tomar atualmente. Como expressam as mulheres venezuelanas: “As guerras nunca foram soluções para os problemas dos povos ou para as diferenças políticas. Uma guerra ou invasão na Venezuela seria condenar a população ao triste destino que outros povos enfrentam. Hoje, vemos a guerra em sua forma mais convencional e destrutiva ameaçando muito de perto nossas vidas (…) estamos convencidas de que a solução virá do diálogo e do compromisso com a paz, nos marcos do necessário respeito internacional a autodeterminação”.

O povo da Venezuela não está sozinho

Nossa solidariedade precisa se concretizar no fazer da resistência venezuelana em defesa da auto-determinação, da soberania e da revolução bolivariana. Não é só o destino da Venezuela que está em jogo, é o destino da América Latina e Caribe. E nosso passado, presente e futuro é de luta e resistência, contra o colonialismo racista, patriarcal e depredador que insiste em tentar usar nossos povos, nossos corpos e nossos territórios como fontes de seu lucro e de seu poder. Temos acumulado na América Latina e no Caribe uma história de sujeitos coletivos organizados, populares, que resistem, anunciam e colocam em prática experiências revolucionárias de transformações sociais rumo a soberania popular, a justiça e a igualdade. É como parte desse caminho que nos posicionamos e enfrentamos esse momento de ofensiva imperialista, conectando nosso combate ao projeto da ultradireita fascista no Brasil com a defesa do processo bolivariano na Venezuela, pela paz e pela auto-deteminação dos povos.

Ouça a íntegra da mensagem da companheira Nalu:

Com informações do Brasil de Fato, da Marcha Mundial das Mulheres e do Portal Esquerda Online

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