Fonte: Agência Carta Maior
Não há consciência nos políticos da gravidade da situação que exige políticas globais que dêem centralidade à Terra. Neste quadro, o Brasil ocupa um lugar singular, possuindo a maior biodiversidade do planeta. Esses temas devem fazer parte da agenda de reconstrução do PT.
LEONARDO BOFF
O PT introduziu novidades na política brasileira como a democracia interna (que não conseguiu evitar desvios do grupo dirigente), o orçamento participativo, a maneira nova de organizar o mandato dos eleitos em orgânica relação com as bases. E inegavelmente o acento (embora ainda insuficiente) nas questões sociais numa perspectiva emancipatória.
Retomar tais opções é uma forma de sair da crise e ocasião para a inteligentsia do partido repensar uma agenda voltada para o futuro. Seria um aspecto de sua renovação interna e um avanço para dentro da nova consciência que está emergindo por todas as partes. Mais e mais se percebe o caráter global dos problemas humanos e a interdependência entre humanidade e meio-ambiente. O paradigma que predominou nos últimos séculos de intervenção sistemática na natureza para utilizar todos os seus recursos está se revelando demasiadamente destrutivo especialmente na Amazônia. O aquecimento do planeta e a escassez de água potável anunciam desastres apavorantes. De uma sociedade de produção industrial há que se passar para uma sociedade de sustentação de toda a vida. De uma economia da acumulaçao ilimitada para uma economia do suficiente para todos. Diz a Carta da Terra:”ou fazemos uma aliança global para cuidar da Terra e uns dos outros ou arriscamos a nossa destruição e a devastação da diversidade da vida”.
Esse cenário é bem fundado, não é alarmista. No entanto, não há consciência nos políticos da gravidade da situação que exige políticas globais que dêem centralidade à Terra. Neste quadro, o Brasil ocupa um lugar singular: somos a potência das águas, possuimos a maior biodiversidade do planeta, dispomos das maiores florestas tropicais do mundo, abunda a biomassa, fonte de energias alternativas junto com ricas reservas de materiais raros, importantes para as novas tecnologias. Além disso apresentamos um ensaio civilizatório expressivo com uma população criativa e aberta ao encontro com todas as demais culturas e sem fundamentalismos.
Concretamente significa que um Governo que pensa para frente não deve ficar refém do atual paradigma dominante que constrange a todos a reproduzi-lo. Deve criar estratégias de desenvolvimento que aproveitem estas vantagens comparativas, pois podem beneficiar altamente a nós e a inteira humanidade.
Mais e mais percebemos que, dentro de poucos anos, o decisivo mesmo não é a economia humana com seu PIB de 15 trilhões de dólares/ano mas a economia natural que se fôssemos pagar o que aporta gratuitamente deveríamos desembolsar 33 trilhões de dólares/ano.
Tais temas deveriam entrar na nova política pensada pelo PT. Logicamente com um pé estará dentro do sistema, pois não há como esquivar-se dele, mas com o outro deve pisar terra nova. Aqui dever-se-ão tentar novas formas de produção com a natureza e jamais à custa dela, uma economia solidária e cooperativa, modos de produção diversificados que rompam a ditadura do modo de produção capitalista.
Se no Brasil se verifica, em miniatura, toda a tragédia da humanidade sofredora, oferece-se aqui também toda a chance de construção de novo modo sustentável de viver. O Governo petista do Acre com seu conceito de florestania está mostrando a viabilidade deste novo olhar. Eis porque, na reconstrução do PT, tudo isso deve ser tomado em conta.
Leonardo Boff é teólogo.
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