Que Copa é Essa! Que minha paixão é futebol todos sabem. Sou Flamengo e minha alemã se chama Sandrinha. Até aí tudo bem. Sou da turma que tinha TV e viu o Tri brasileiro em preto e branco. Timaço! Ruas cheias no Rio que acreditavam na conquista. Um tempinho depois, quatro anos, na estréia da TV colorida, na casa de vizinhos, vi a seleção canarinho cair contra a chamada “Laranja Mecânica”. O futebol era outro. Nós com um time de velhos, mas com talentos, por pouco não ganhamos. Ah! Aquela entrada do Paulo César pela esquerda no primeiro tempo. Até que no segundo o Luis Pereira foi expulso. Ali fudeu! Mas perdemos para um futebol melhor. Nesse período tínhamos torcida nas ruas. Na Copa de 82 então foi uma farra. No Rio a turma pintava avenidas. Havia esperança, craques: Zico, Sócrates, Falcão ou Éder; na prática Flamengo, Coríntians, Inter ou Atlético? Todos tinham um ídolo para torcer. Igual a antigamente: Pelé ou Garrincha, Santos ou Botafogo? Rivalidades reais, positivas e concretas. Que Copa foi essa? Não tinha clima nas ruas. Não virou assunto de butiquim. Torcíamos porque era o Brasil, quase como obrigação, sem paixão. Vi todos os jogos em casa, não me animei para programas coletivos. Afinal não via um craque que pudesse me fazer torcer com alma. A única esperança minha de alguma novidade nessa Copa passou a ser o time da Alemanha, mas vamos ver daqui a pouco eles contra a Argentina. Acho que desse time desperta um futuro craque, o Oezil, o meia com cara de “Avatar”. Há muito não existe um craque de verdade, aquele inquestionável, com obra e consistência por tempos. Pra mim o Zidane foi o último e sobre isso já falei a quatros anos atrás. Ainda não apareceu outro dessa envergadura, inclusive no futebol brasileiro. Tudo bem, mas o Brasil pode ainda apresentar-se melhor. Tem jogadores acima da média mundial para manter a sua principal característica, um futebol ofensivo. Porém, quando a principal virtude de nossa seleção é o “melhor goleiro do mundo” e a “zaga impecável” européia, temos um problema. O Brasil nunca se apresentou ao mundo por ter uma excelente defesa, mas sim um meio criativo e um ataque arrasador. Essa é a nossa marca. Marca brasileira, da irreverência. Foi fundamental ao Brasil, após o futebol força de 1974, aprimorar seus jogadores de defesa, em particular seus goleiros. Tínhamos a fama de perdermos jogos por “goleiros que não saíam do gol” ou de zagueiros que não “subiam bem”. A pecha de baixinhos e desorganizados. Essa crítica mundial amainou-se, particularmente pós Taffarel e as zagas à partir de 94. Porém, essa evolução nos jogadores de defesa não mudou a principal marca da seleção canarinho, futebol pra frente, ofensivo. Essa nossa seleção não tinha craque, é fato, pois inexista. Um craque não se fabrica. É uma criação divina. Nascem quase prontos. Por serem divinos, são de difícil trato. Mais ainda, os Deuses quando os fazem, por preguiça, os fazem em séries. Daí, em épocas aparecem muitos, em outras escassam, para o descanso dos Deuses. Não tínhamos esses juntos conosco, mas tínhamos outros melhores. Nas guerras o líder sempre foi fundamental em disputas, ainda mais na inexistência de grandes guerreiros. Um verdadeiro líder não vem de trás, da zaga. Ele ta sempre na peleja, guerreando pra frente, pra vencer. Lembrem-se da figura do Didi em 1958 pegando a bola dentro do gol do Brasil, botando a pelota de baixo do braço e em passos lentos acalmando e orientando todo o time para a vitória. Puta líder! Quem foi esse líder do Brasil nessa seleção quando a Holanda empatou o jogo e depois virou? Quem botou a bola debaixo do braço, acalmou a turma e organizou uma reação? Ninguém! Não poderia ser o goleiro ou a zaga. Essa não é uma tarefa de retaguarda. Nessas horas o craque tem de aparecer, se não tem o craque, que o façam os melhores jogadores ofensivos do time. Esse foi o problema! Os jogadores para isso eram o Kaká, Robinho e Luis Fabiano. Kaká, contundido e com histórico de amarelar em finais; Robinho, uma sensação juvenil e de marketing, mas um peladeiro; Luis Fabiano um matador eventual, longe de ser estável. E no banco de reservas. Imaginem o Adriano ou Ronaldinho Gaúcho aquecendo pra entrar. O temor do adversário com esses jogadores consagrados. Mas não estavam lá. Quem estava? Josué, Kleberson, Julio Batista e Grafite. Brincadeira! Seleção não é lugar pra bom mocinho e sim pra quem joga futebol, bons ou maus meninos. Mil vezes um Almir “o Pernambuquinho”, ganhava na bola ou no tapa. Morreu como viveu, numa briga de butiquim. Tomou uma facada mortal.
Veja também
Reconstituir o sujeito | Luiz Marques
O tema da “sujeição” passa por Etiénne de La Boétie, em A servidão voluntária (1577). …
Comente com o Facebook