Luiz Inácio Lula da Silva, Celso Amorim e Fernando Haddad
A integração da América do Sul -e mais amplamente da América Latina e Caribe- foi uma prioridade de primeira hora de nosso governo, enunciada de forma clara já no discurso de posse, em 2003.
Seguiram-se ações concretas para o fortalecimento do Mercosul e avanços na integração sul-americana, que teve como um dos principais marcos o Acordo Mercosul-Comunidade Andina.
Deste acordo, nasceria a Casa (Comunidade Sul-Americana de Nações), precursora da Unasul (União de Nações Sul-Americanas).
Em dezembro de 2008, alargamos o horizonte da cooperação com a realização da primeira Calc (Cúpula dos Países da América Latina e Caribe), passo inicial para a criação da Celac (Comunidade da América Latina e Caribe).
Não descrevemos todas essas siglas com o objetivo de embaralhar o leitor nessa teia de organizações internacionais. De fato essas foram medidas de grande alcance para que a América Latina pudesse cuidar de seus interesses, sem a tutela de nações ricas que sempre haviam exercido hegemonia sobre a nossa região.
Conflitos potenciais entre países e crises internas puderam ser encaminhados de forma adequada, sem interferências ou imposições de interesses exógenos. A América do Sul ganhou personalidade internacional, promovendo diálogo e cooperação com outras nações em desenvolvimento da África e do mundo árabe.
Faltava coroar o esforço de integração com uma instituição de natureza educativa e cultural, capaz de aproximar os povos da América Latina e do Caribe, a começar pelos jovens. A criação da Unila (Universidade Federal da Integração Latino-Americana), em Foz do Iguaçu (PR), veio suprir essa necessidade.
A instituição conta com 3.500 alunos matriculados, de diversas partes do Brasil e de outros 19 países da região. Oferece 22 cursos de bacharelado, sete cursos de licenciatura, 13 cursos de pós-graduação.
Em todos os cursos de graduação, a universidade oferece metade das vagas para estudantes brasileiros e metade para estrangeiros. No decorrer deste ano, realizou 160 projetos de extensão e 326 de pesquisa. Tais ações beneficiam mais de 115 mil pessoas de 20 municípios da região-fronteiriça.
É inacreditável que um projeto dessa grandeza, de alto valor simbólico, esteja ameaçado por uma proposta parlamentar que visa a extinguir a Unila, a pretexto de transformá-la na Universidade Federal do Oeste do Paraná.
No entanto, a região já dispõe da Universidade Federal do Paraná e da Unioeste, com campi em dois e em cinco municípios, respectivamente, além do Instituto Federal do Paraná, que oferece formação em nível superior.
A proposta de extinção da Unila está contida na emenda aditiva nº 55, apresentada pelo deputado federal Sérgio Souza (PMDB/PR) a uma medida provisória que versa sobre as regras do Fies.
Vale lembrar que a lei nº 12.189, de 2010, que determinou a criação da Unila, foi aprovada por unanimidade em todas as comissões pelas quais passou.
Não podemos permitir que os povos latino-americanos e caribenhos deixem de dispor de um ponto de encontro para seus jovens intelectuais, professores e pesquisadores.
Não podemos voltar ao tempo em que o diálogo tinha que passar necessariamente por instituições norte-americanas ou europeias.
A integração da América do Sul e da América Latina e Caribe não é projeto de um governo apenas. Nada tem de ideológico. É a realização de um mandato constitucional.
O futuro do Brasil está inevitavelmente ligado ao dos demais países da região. Não há paz sem desenvolvimento, mas tampouco há desenvolvimento sem paz.
E não haverá integração se não apoiarmos iniciativas que aproximem as cabeças pensantes de nossos países.
Fechar a Unila, seja qual for o pretexto, não é apenas um crime contra a jovem intelectualidade latino-americana e caribenha. É um crime de lesa-pátria.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA foi presidente da República (2003-2011)
FERNANDO HADDAD foi ministro da Educação (governos Lula e Dilma) e prefeito de São Paulo
CELSO AMORIM foi ministro de Relações Exteriores (governo Lula)
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