Convencer o PT de que deveria haver candidatura própria em Fortaleza não foi fácil. A base municipal do partido já tinha esse sentimento desde 2002. Dentre três pré-candidatos, Luizianne Lins foi a escolhida. Jornalista e professora universitária, ela é atualmente deputada estadual, e confirma sua trajetória de lutas aguerridas presidindo a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Ceará. Em entrevista ao Democracia Socialista, ela expõe suas propostas para a cidade e analisa o cenário das eleições.
[ERRATA para edição impressa: Não houve prévias em Fortaleza. O Encontro Municipal decidiu por candidatura própria e outro Encontro decidiu que Luizianne é a candidata].
Fortaleza é mais PT
Município com mais de 2 milhões de habitantes, Fortaleza foi uma das primeiras capitais em que o PT foi eleito para a prefeitura, em 1985. O partido, entretanto, não lançava candidatura própria para as eleições municipais desde 1992. Esse ano o PT volta a ter candidato. Luizianne Lins, jornalista e professora universitária, venceu as prévias e irá disputar a prefeitura.
A trajetória da atual deputada estadual a credencia. Luizianne foi presidente do PT de Fortaleza, e tem uma história de lutas aguerridas. Enfrentou o turismo sexual no estado, a máfia das carteirinhas estudantis, e atualmente preside a Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa. Nessa entrevista, ela conta sobre a opção da candidatura própria, fala do cenário de uma eleição com seis candidatos fortes e expõe as suas propostas para Fortaleza.
Faz doze anos que o PT não disputa diretamente a Prefeitura de Fortaleza. Por que a opção de sair candidata?
Trata-se, em primeiro lugar, de um sentimento forte na maioria da base do PT. Ele vem desde as eleições para governador em 2002, quando José Airton ganhou a prévia, foi candidato e chegou ao segundo turno. Acabou perdendo por apenas 3000 votos. Isso dentro de um cenário em que o PSDB era favorito, e não se acreditava que um candidato da esquerda pudesse chegar, nem que haveria um segundo turno.
Desde lá ficou perceptível a importância da candidatura do PT. A votação expressiva do José Airton em Fortaleza também contribuiu, e chegamos agora com um sentimento forte na base do partido pela candidatura própria. Isso ficou expresso na existência de 3 pré-candidaturas.
Qual foi a avaliação em relação à possível aliança com o PC do B?
Nós apoiamos o Inácio Arruda [candidato pelo PC do B] duas vezes, em 1996 e depois em 2000. Na ocasião eu era presidente do PT de Fortaleza e fizemos a opção pela candidatura do Inácio, mesmo tendo maioria no partido para me lançar candidata a prefeita já naquele momento. E jogamos um peso grande na campanha dele.
Portanto não temos nenhum veto ao nome dele, nenhum tipo de restrição, mas consideramos importante ter algumas alternativas de esquerda para garantir estar no segundo turno. Seja com a minha candidatura, do deputado Inácio Arruda ou do deputado Heitor Férrer, que é do PDT mas que sempre se articulou aqui no Ceará com a esquerda.
O próprio PT nacional aponta Fortaleza como a cidade mais petista do Brasil, ou seja, o maior percentual de eleitores que tem o PT como partido favorito se dá em Fortaleza. Isso é muito importante, porque mostra que o partido pode ter um grande potencial eleitoral. Também foi algo que nos motivou.
Com tantos candidatos, com quem vai se dar a disputa nas eleições? Qual o cenário que te aguarda?
Vamos disputar, em primeiro lugar, com a máquina do PMDB, há 14 anos no poder. O atual prefeito Juraci Magalhães apóia a candidatura do seu secretário de finanças, Aloísio Carvalho. Eles vêm marcados pela corrupção, em função de muitos escândalos que aconteceram, inclusive em torno da família do Prefeito. O uso da maquina é escancarado, com muito assistencialismo. Também o PSDB e o PFL terão candidatos próprios.
Além disso, vamos ter três candidaturas da esquerda. Uma questão fundamental será manter o respeito mútuo, sem agressões nem jogo pesado de bastidores. Claro que essa é uma preocupação de uma forma geral na campanha, mas em especial com o campo da esquerda.
É um cenário muito provável que vá no mínimo uma candidatura de esquerda para o segundo turno, e aí temos que garantir uma aliança incondicional. É importante que já se acorde que independentemente do resultado eleitoral – seja a nossa candidatura, a do Inácio ou a do Heitor – nós possamos estar aliados para derrotar a direita.
Quais os principais planos para Fortaleza?
É preciso pensar a cidade com um outro tipo de relação entre poder público e sociedade, entre quem administra o orçamento, quem decide as prioridades da administração pública e das políticas públicas e a população. Estamos nos dispondo a contribuir principalmente para mudar a cultura política do município.
Além disso, o PT traz de suas administrações inúmeras experiências de políticas públicas bem sucedidas. Temos a preocupação de que elas sejam massificadas, atinjam uma grande parte da população, e que sejam viáveis do ponto de vista orçamentário, que nós realmente possamos priorizar. Não podemos dizer ao povo que nessa sociedade capitalista conseguiremos resolver todos os problemas de uma cidade. É preciso estabelecer prioridades, com consciência dessas limitações.
Como vocês pretendem materializar esse processo de participação popular e democracia participativa?
Um ponto fundamental, que já vem sendo desenvolvido no processo da campanha, são os seminários regionais, no formato de assembléias populares. Dividimos estrategicamente a cidade em 22 micro-regiões onde estão acontecendo seminários regionalizados de bairro. A partir de um material do diretório municipal, nós temos debatido questões como Agenda XXI, a construção dos conselhos populares e a idéia de um governo democrático e popular.
As pessoas então se dividem em grupos e partilham o que seriam essas experiências no seu local de moradia, no seu bairro, na sua cidade. Isso aponta que desde o primeiro momento nós vamos ter uma diferença fundamental: a participação popular. Mecanismos efetivos para que a gente possa, a exemplo de outras capitais, como Porto Alegre, fazer o povo da cidade sujeito de uma administração pública. Esse é um fundamento básico, que vai nortear todas as etapas do programa de governo.
Como articular essas políticas com as propostas específicas de cada área?
Estamos formulando propostas também a partir de áreas temáticas, como por exemplo a questão da Saúde. Hoje só temos efetivado cerca de 16% do Programa de Saúde da Família em Fortaleza. Nossa equipe fez esse diagnóstico e já está promovendo um levantamento junto ao Ministério da Saúde e à Prefeitura para saber, na prática, o que significaria efetivar 100% da cobertura do PSF. Quanto isso depende do Município e o quanto do Governo Federal? Para todo o programa de governo estamos buscando apontar algumas saídas concretas.
Também quero trazer para o âmbito municipal o debate sobre Direitos Humanos. Uma proposta é a criação de instituições protetoras dos direitos dos cidadãos e cidadãs mais humildes. Por exemplo, um serviço de assistência jurídica gratuita, uma espécie de defensoria pública municipal. Seria igualmente fundamental um serviço municipal de defesa do consumidor, inclusive quanto aos serviços públicos, principalmente os terceirizados.
Como será a experiência de ser candidata pelo mesmo partido que governa o país?
Será um momento muito específico para as candidaturas do PT, é a primeira vez que isso acontece. Isso vai trazer algumas situações que nós nunca lidamos, tanto coisas positivas como negativas. Temos que assumir isso com humildade. Está todo mundo na expectativa do Governo Lula, todo mundo querendo que dê certo, mas preocupado com os rumos. Ficamos naquele sentimento de torcer para que dê certo.
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