Leia artigo que discute a democracia participativa a partir da experiência do governo de Sergipe, buscando apontar para as oportunidades abertas e os riscos que se corre. O tema da democracia participativa foi um dos principais debates do item diretrizes de programa de governo no IV Congresso do PT.
Antonio Santana Carregosa *
“Eis que embarcamos em uma transição incerta, em que o
velho agoniza sem ser abolido, o novo pena para eclodir,
entre um passado ultrapassado e a descoberta
balbuciante de um novo mundo em gestação”.
(Daniel Bensaïd)
Em outubro de 2009 defendemos uma dissertação de mestrado em sociologia na Universidade Federal de Sergipe, em que a democracia participativa esteve no centro da discussão. Tratou-se de uma pesquisa sobre a experiência em andamento nesse estado – o Planejamento Participativo de Sergipe (PP) –, instituído pelo governo estadual em 2007. Não obstante os limites inerentes a um estudo espacial e temporalmente localizado, acreditamos que no que se refere aos impasses e desafios da democracia participativa a pesquisa tem algo a dizer.
Uma primeira observação importante é que não só a nossa, mas várias pesquisas sobre experiências de orçamento participativo atestam que a democracia participativa “tem lado”, como diz Raul Pont. Se a democracia de um modo geral não mobiliza uma base social homogênea, a democracia participativa em particular tem operado sob a hegemonia das classes populares e isso tem conseqüências sobre seus resultados. Importante frisar que no caso por nós estudado havia também uma hegemonia feminina nas reuniões de base (56,7%) revelando a permeabilidade destes espaços.
Outra observação positiva diz respeito ao potencial educador que a democracia participativa comporta. De fato, os espaços de discussão da democracia participativa têm estimulado um intercâmbio de saberes, particularmente, entre o saber técnico e o saber popular, que acaba promovendo um mútuo aprendizado entre os diversos segmentos. Trata-se, neste sentido, de uma contribuição da democracia participativa para a formação de uma nova cultura política.
Por outro lado, observamos que muitas experiências – inclusive a que estudamos – têm apresentado dificuldade para garantir a efetividade e a institucionalização do processo. Sobre a efetividade nos referimos ao cumprimento fiel das deliberações oriundas dos espaços participativos. Já quanto à institucionalização nos referimos ao arranjo jurídico-organizativo que, em última instância, é o que pode assegurar a autonomia dos atores e a auto-regulação do processo. Aí verificamos uma grande resistência por parte de muitos governantes quando se trata de dividir o poder. O problema é que a continuidade e a credibilidade destas experiências dependem justamente de sua capacidade de dar respostas e de aperfeiçoar-se permanentemente no sentido de motivar a mobilização e a participação social.
Enfim, observamos que se de um lado a democracia participativa tem se consolidado como componente da agenda dos governos e movimentos populares, por outro não tem escapado aos problemas inerentes ao Estado e ao sistema política brasileiros. O risco é que estes espaços passem a compor mais uma instituição burocrática e ineficiente como tantas outras, o que seria um retrocesso em relação ao que já se acumulou com tantas experiências exitosas. O desafio, portanto, é de lutar pela efetividade e pela auto-regulação. Ademais, é necessário ressaltar que se desenvolvendo no bojo de um tempo em transição, a democracia participativa demanda um grande esforço reflexivo dos próprios atores envolvidos nas diversas experiências, inclusive, dos partidos políticos. É só assim que poderá consolidar-se como instrumento de inclusão social e de construção de uma nova cultura política – democrática e emancipatória.
* Antonio Santana Carregosa (Toninho) é bancário, mestre em sociologia e militante do PT e da DS em Paripiranga/BA.
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