A primeira manifestação explicitamente bolsonarista empacou no meio do caminho. Impressiona, por um lado, o número expressivo de pessoas nas ruas para defender um governo e uma agenda reacionária, atacar as instituições, os partidos e a democracia como sistema. A “linha dura” da extrema direita mostrou capacidade de mobilização.
Fracassa, no entanto, o objetivo de “emparedar a república”. Os atos foram muito menores que as marchas do #15M, que mobilizaram mais de 1,5 milhão de pessoas em todo país. Convocados por uma direita rachada – segmentos como MBL, a ala direita do PSDB e até figuras proeminentes da base ativa do bolsonarismo, como as deputadas Joice Hasselman e Janaína Paschoal, afastaram-se publicamente das mobilizações – as manifestações não acumularam o suficiente para subordinar o Congresso aos ditames do presidente, tampouco para qualquer saída que envolva o fechamento do regime.
Neste ambiente, permanece o impasse no interior da eclética coalizão governista, e o saldo é desfavorável para Bolsonaro. Relutante em negociar com o Congresso, e sem força real para impor sua vontade, o quadro aponta para a manutenção da paralisia e da crise – política e econômica – que assola o país. Uma força política que reúne centenas de milhares de pessoas ao redor do país para defender uma agenda autoritária e um governo em crise, com seus líderes atolados em denúncias de envolvimento com corrupção e outros crimes, tem musculatura, ao menos por enquanto, para manter-se no jogo.
Para a esquerda, a crise abre fissuras importantes. A agenda ultraneoliberal do mercado, apoiada pelo conjunto da base do governo, é profundamente antipopular e não constitui, por si só, legitimidade e força para a sua implementação. Ao mesmo tempo, a defesa da educação pública reconstituiu uma dinâmica de ação unitária com aceitação de amplos segmentos sociais e alta capacidade de mobilização; os atos marcados para o próximo dia 30 de maio constituem uma oportunidade ímpar de superar novamente a capacidade de mobilização do governo e acumular forças em direção à greve geral do dia 14 de junho.
A confusão no interior do bloco de poder permanece longe de um desfecho. A “saída bonapartista” de Bolsonaro não tem, pelo menos no momento, a menor possibilidade de implementação – e nada leva a crer que um governo em queda de popularidade conquiste força para fechar o regime. O congresso aumentou seu poder de barganha e a insistência em medir forças com o parlamento pode inviabilizar a aprovação de questões dadas como centrais pelo presidente, como a MP da reforma administrativa.
Os próximos dias serão importantes para a reconstrução da legitimidade pública e a ampliação da força política do campo democrático e popular. A chave está no peso e na dinâmica das mobilizações do dia 30. Os atos em defesa da educação podem evoluir para um questionamento mais amplo da barbárie reacionária, reorganizando um polo capaz de fortalecer-se como alternativa à crise política e econômica do governo Bolsonaro. É nesta fogueira que devemos botar a lenha disponível no momento.
Bernardo Cotrim é jornalista e militante da Democracia Socialista.
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