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UMA PONTE PAR A O ATRASO

2630606 (1)O comportamento do vice-presidente Temer e do presidente da Câmara Federal, deputado Eduardo Cunha, principais dirigentes do PMDB, despertam cada vez mais indignação e perplexidade ao povo brasileiro. O deputado Cunha apesar do volume e da robustez das provas contra ele (contas secretas na Suíça, acusações na Operação Lava Jato, declarações mentirosas na CPI) continua na Presidência da Câmara, usando e abusando do poder casuístico da Mesa para impedir que a Comissão de Ética abra seu processo de cassação. Isso ocorre pela seletividade do Judiciário onde para alguns a prisão preventiva sem provas ou julgamento já se transformou em pena antecipada e pela cumplicidade de seus aliados na Câmara Federal (PSDB, DEM, PPS, PP, PMDB etc.) que não formam uma maioria que devolva o decoro e a dignidade que o Parlamento deveria ter, mudando a Presidência da Casa.

O vice-presidente Michel Temer supera-se em cada ato em pusilanimidade e ridículo. Após quatro anos de gestão junto a presidente Dilma, na qual aceitou, voluntariamente, ele e seu Partido, participarem de um governo com um projeto definido, dedicar-se nos últimos meses ao golpismo e às lamúrias pueris que só revelam a ausência de atributos para o exercício da função pública.

Mesmo com todas as concessões feitas pela presidente Dilma neste segundo mandato, com mais cargos, ministérios e a entrega da coordenação política com o Legislativo, a resposta foi o loteamento de mais cargos e a conspiração permanente contra o próprio governo.

Um exemplo simbólico, entre outros, ocorreu aqui mesmo, na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, quando Temer e Cunha vieram apresentar e defender a “minirreforma” política que tentava constitucionalizar o financiamento empresarial aos candidatos. Tema, inclusive, em que o presidente da Câmara é especialista e um dos grandes despachantes dos lobistas das organizações empresariais que frequentam o Congresso.

Por mais patéticas que sejam essas figuras, seria um equívoco achar que se movem por seus individualismos, fundamentalismos ou simples defesa de mesquinharias pessoais.

São dirigentes políticos do maior partido do país e, evidentemente, o apoio e sustentação que possuem não vem de suas virtudes pessoais, mas dos interesses que, efetivamente, representam.

O PMDB, através de sua Fundação Ulisses Guimarães e em reunião com sua direção nacional, em outubro, apresentou ao país um diagnóstico da conjuntura e um projeto para o Brasil dos próximos anos. Alardearam, aos quatro ventos, seu programa chamado “Uma Ponte Para o Futuro” e com pompa e circunstância o estão apresentando como o lastro, o alicerce para serem uma alternativa de governo em 2018.

Podemos ser injustos com setores  do PMDB que não concordam com o conteúdo do mesmo, pois a federação de interesses regionais em que se transformou o partido nos leva a acreditar que essa revisão programática não passou por um profundo debate nacional e nem culminou num processo convencional democrático. Não ouvimos, no entanto, vozes públicas discordantes quanto ao seu arrazoado. Sabemos que há setores no PMDB que ainda se reivindicam do nacional-desenvolvimentismo. O Partido, no entanto, está subordinado a hegemonia de Temer e Cunha.

Uma coisa é certa, cristalina. É a ruptura com o discurso histórico do PMDB de sua herança na luta democrática contra a ditadura cívico-militar de 64 e dos compromissos que seus dirigentes sempre apregoavam com o projeto nacional desenvolvimentista que, genericamente, se expressa no projeto de capitalismo nacional do Getulismo.

Aqui no Rio Grande, Pedro Simon e tantos outros sempre disputaram com os trabalhistas as homenagens e flores a Vargas e sua Carta Testamento encravada na Praça da Alfândega em Porto Alegre. Era o reconhecimento de um projeto.

Agora, o partido adere de mala e cuia ao projeto neoliberal e aí estão as raízes profundas do desconforto com o governo Dilma. Os parâmetros do diagnóstico baseiam-se na Meca do neoliberalismo, o Fórum Econômico Mundial e dali recolhem a crítica as vinculações de gastos sociais na Constituição bem como a crítica a “indexações na política salarial” e na necessidade de “desregulamentar” o Estado. Quando falam em vinculações referem-se à Educação, à Saúde, à Assistência Social. O caráter impositivo das “emendas parlamentares”, excrecência política e antessala da corrupção capitaneada por Cunha na Câmara Federal não sofre a mesma objeção.

Na síntese final do documento programático do PMDB, a letra “d” é um resumo exemplar do programa: “d) executar uma política de desenvolvimento  centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se  fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime anterior de concessões na área de petróleo, dando-se à Petrobras o direito da preferência”.

Sobre a América Latina e os blocos econômicos o texto dá o tom de seu compromisso com a não integração dos povos sulamericanos. Para o PMDB, essa integração deve ocorrer com ou sem o Mercosul (grifos nossos).

A política tributária é tratada genericamente e a crítica incide  sobre o volume de carga tributária, bem a gosto dos neoliberais. Os pretensos 35% sobre o PIB atuais seriam um exagero. Mas não há nenhuma palavra sobre as desonerações, incentivos e isenções etc. que, de fato geram uma carga inferior a 20% no PIB do Brasil. Sobre o caráter regressivo dessa carga, assentada sobre o consumo, principalmente, nenhuma linha. É claro que o documento ainda prega a “desoneração das exportações e dos investimentos” (item i) como se sobrasse alguma coisa depois do tucanato e da Lei Kandir que nos conduziu a exportadores de cereais e de minérios.

O texto termina nos convidando, candidamente, que nos integramos, junto com a nação, “a esse sonho de unidade”.

A ponte para o futuro nos conduz a divisão internacional do trabalho do Sec. XIX. Não tem nada de futuro e sim, significa o atraso, a rendição incondicional ao discurso tucano neoliberal.

Mesmo com as concessões feitas no governo Dilma pela desastrada política econômica do Ministro Levy e do Banco Central que, em parte, caminha nessa direção, os “aliados” Cunha e Temer querem derrubá-la. Estão fazendo de tudo com esse objetivo desde a violência dos atropelos de Cunha no comando da Câmara aos choromingos de abandono e maus-tratos.

No fundo, expressam muito mais um projeto político do que estripulias e idiossincrasias pessoais. São aliados firmes do tucanato e da grande burguesia e dos bancos que há dois anos fazem “greve de investimentos” e se locupletam com as taxas de juros do Banco Central.

A grave crise que vivemos deve servir para clarificar esses projetos em disputa. O ano de 2016 – ano eleitoral – poderá ser um laboratório para isso.

De nossa parte, continuaremos insistindo que o governo Dilma rompa com essa chantagem e com essa política econômica que não é a nossa. Afinal, reelegemos o projeto apontando para o emprego, a distribuição de renda, a inclusão social e a soberania nacional.

Este é o projeto que os brasileiros e brasileiras esperam.

 

Natal 2015

Raul Pont, professor

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