O texto que segue introduz a discussão do conceito de biossegurança aplicado à educação. Biossegurança é um conceito transdisciplinar com origem na biologia e nas ciências médicas, mas tem uma dimensão sociológica ampla que pode contribuir rpara o aprendizado e a compreensão dos fenômenos inerentes à crise climatica provocada pelas açóes humanas.
Os tempos atuais nos indicam a necessidade de um projeto de cidade que contemple como polítiica educacional e como atividade curricular as questões pertinentes à crise climática. Esta perspectiva nos remete para a integração do conceito de biossegurança, não limitado às pesquisas biológicas e a atividades clínicas, mas em sua abrangência sociológica e pertinência com o que provoca riscos à vida no universo social.
Os setores populares, em geral, partilham de forma consensual conceitos que funadamentam uma educação popular, cidadã e transformadora.
Esses funadamentos assentam-se sobre conceitos que orientam práticas de políticas públicas e reivindicações sociais no campo educacional. Entre os elementos fundantes pode-se elencar :a educação, pública, laica e gratuita; a educação integral de qualidade como direito; a democratização nas dimensões da gestão, do acesso e da aprendizagem, garantindo o protagonismo de todos os sujeitos que atuam ou que se relacionem com a comunidade escolar; a valorização profissional considerando salário, condições de trabalho e formação permanente; garantia de espaços e recursos qualificados que estimulem o trabalho docente e o aprendizado do aluno; um projeto político pedagógico constituido de forma participativa; construção do conhecimento pelo sujeito na perspectiva interdisciplinar, na relação com o contexto socioantropológico, com o mundo do trabalho e com os saberes e experiencias humanas acumulados; a articulação ensino e pesquisa como prática pedagógica, geradora de uma cultura de investigação; respeito e acolhimento à diversidade, considerando gênero, etnias, culturas, orientação sexual, religião e ideologias; condições objetivas para a inclusão de pessoas com necessidades especiais; avaliação emancipatoria e participativa; projeto educacional integrado a um projeto global de gestão da cidade; integração com demais órgãos públicos, com universidades e políticas públicas; educação com vínculos às especificidades das territorialidades e seus universos sociais; a articulação entre o local e o universal.
Não é objeto, neste texto, o desdobramento destes elementos nas ações específicas e diversas decorrentes da amplitude de cada um deles.
No entanto todos esses conceitos e fundamentos terão que ser efetivados em ações em uma cidade atingida profundamente pela crise clímática global, com as suas piores e mais danosas consequencias. Frente a essa nova realidade o princípio de defesa da vida torna-se ainda mais abrangente e imperativo.
A educação escolar necessita integrar na atividade curricular o conceito de biosegurança para produzir de forma ampla e profunda a consciência da defesa da vida em todas as suas faces. O conceito de biossegurança afirma uma nova dimensão de aprendizado de defesa da vida e possibilita a formação de um cidadão comprometido com a preservação dos elementos naturais que garantem a existência humana e da vida em geral.
A ANVISA define biosegurança como: “condição de segurança alcançada por um conjunto de ações destinadas a prevenir, controlar, reduzir ou eliminar riscos inerentes às atividades que possam comprometer a saúde humana, animal e o meio ambiente”.
Contudo, biossegurança demanda uma educação que não seja limitada à saúde na sua acepção restrita, mas a saúde de Gaia, da Mãe Terra, e dos que nela vivem e dela dependem, posto que Gaia é a casa onde são possíveis todas as formas de vida. E não se pode dicotomizar natureza humana e natureza física. A vida humana só é possível em harmonia com todas as formas de vida e recursos físicos que o planeta disponibiliza.
A educação escolar não é responsável pela gestão das políticas públicas de defesa do planeta, mas é o espaço privilegiado para a formação de um cidadão com consciência ambiental. Um cidadão “não negacionista”, que perceba a importância das vacinas, que se comprometa com a preservação dos banhados, dos mananciais hídricos, das matas ciliares, das florestas, dos animais e de todos os recursos esgotáveis. Mas também se importem com a defesa dos povos da floresta, com o drama dos refugiados, das migrações forçadas por problemas climáticos e políticos: com a insegurança alimentar de milhões de pessoas e com o uso de agrotóxicos na produção de alimentos.
A educação na cidade é desafiada a formar um cidadão com consciência crítica sobre a crise climática, provocada pelos humanos, e sobre a necessidade de mitigar seus efeitos, bem como desenvolver ações para harmonizar as relações entre humanos e ambientes, prevenindo novas catástrofes.
A escola é o lugar de aprender a encaminhar de forma adequada os destinos do lixo, de aprender sobre porque é necessário captação da água da chuva, da energia solar, sobre o tratamento do esgoto, sobre a responsabilidade individual e social de defesa e preservação de todas as formas de vida e de todos os recursos disponibilizados pela Mãe Terra, (Gaia), A casa da humanidade. Mas é também na escola que se pode ensinar e aprender porque pessoas vivem em áreas de risco, em condições sanitárias insalubres e em sub-habitações.
A escola da cidade é o lugar de formar gerações, cujo objeto é produzir cultura para uma cidade socialmente justa, onde o ser humano conviva com dignidade no espaço social e natural.
Jose Clovis de Azevedo é Professor, pesquisador, doutor em Educação pela Universidade de São Paulo, USP. Foi Secretário de Educação de Porto Alegre (1997-2000), Secretário de Educação de Estado do Estado do Rio Grande do Sul (2011-20014).
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