Somos um partido que sempre se pautou por disputas de ideias, de projetos, de estratégias. E é assim que continuaremos sendo

1.
No dia 12 de março de 2025, tomei a iniciativa de me dirigir à nossa militância com uma carta que inaugurou, de maneira qualificada, o debate sobre os rumos do nosso Partido dos Trabalhadores e das Trabalhadoras, do governo do presidente Lula, do nosso projeto de sociedade e, de forma ainda mais ampla, sobre o futuro do Brasil.
Essa carta, que foi inicialmente publicada no site oficial do Diretório Nacional, ganhou vida própria. Foi difundida por diversas publicações, da mídia progressista à imprensa conservadora e alcançou amplitude muito maior graças às redes petistas e às discussões que suscitou.
Companheiros e companheiras que também se apresentaram como pré-candidatos saudaram a iniciativa, tecendo comentários críticos, pertinentes e, acima de tudo, bem-vindos. Essa reação só confirma que o que propusemos não foi uma imposição, nem uma palavra final, mas sim a abertura de um espaço necessário para o diálogo e a construção coletiva.
Reconheço que nem todos os temas puderam ser aprofundados naquele primeiro momento. E isso não se deu por omissão ou por falta de visão crítica, mas porque o objetivo central era convocar mais pessoas a refletirem, debaterem e se engajarem. Era preciso gerar alento, fazer com que a esperança voltasse a ter a política como motor de transformação.
A carta tratou de questões fundamentais que precisam, agora, ser reafirmadas com ainda mais vigor.
2.
Vivemos uma crise global – econômica, social, política, cultural e ambiental – entrelaçada de maneira indissociável com o capitalismo, a opressão racial e os antagonismos bélicos. Não podemos nos iludir: esses elementos não são externos a nós. Eles nos atravessam. Nos desafiam. E exigem uma ação política consciente, estratégica e transformadora.
Diante deste cenário, lancei a minha candidatura à presidência Nacional do PT, no último dia 25 de abril, no Sindicato dos Engenheiros, em São Paulo, como parte da renovação partidária conduzida pelo Processo de Eleição Direta (PED) 2025.
Como ex-presidente do PT de 2011 a 2017, me coloco novamente à disputa como nome capaz de conduzir o PT no processo de renovação e de enfrentamento frente à nova sociedade brasileira, sem abrir mão do combate à extrema-direita no Brasil e no mundo.
Além disso, precisamos avançar na democratização do Estado brasileiro. Isso implica, de maneira urgente e inadiável, em pôr fim à tutela militar sobre a política, alterando o artigo 142 da Constituição Federal. A presença dos militares como tutores ou árbitros da vida política nacional é um resquício autoritário que já deveria ter sido superado. E será, se formos firmes e coerentes com nossos princípios democráticos.
Outro ponto que defendo é a correção de rota, retomando a discussão da reforma política, essencial para criar um ambiente institucional capaz de apoiar propostas fundamentais como a adoção do voto em lista partidária e a implementação de plebiscitos convocados tanto pelo Poder Executivo quanto por iniciativa popular. Sem isso, continuaremos reféns de um sistema que favorece o poder econômico e individualiza a política, dificultando a construção de projetos coletivos de transformação.
Outro fator importante são as pressões crescentes do capital financeiro, que se movimenta para capturar o orçamento público em nome da austeridade fiscal. Não é uma disputa técnica: é uma disputa política. Se permitirmos que os interesses do mercado ditem os rumos do orçamento, comprometemos a capacidade do Estado de implementar políticas de justiça social e de promover o desenvolvimento nacional soberano. Por isso, nosso papel é apoiar o governo Lula, mas apoiar criticamente, com consciência de que nossa função é resistir a essas pressões e fortalecer o projeto popular.
Reitero a necessidade de rechaçar os apelos de “despolarização”. Essa palavra, tão usada pela mídia hegemônica, é, na prática, um instrumento para tentar empurrar o PT para o centro político, enfraquecendo nossa identidade, diluindo nosso programa e rebaixando nossa organização. Não existe neutralidade num país tão desigual quanto o Brasil. Despolarizar, nesse contexto, é abrir mão do nosso lado: o lado dos trabalhadores, dos pobres, das mulheres, da juventude, da população negra, indígena, LGBTQIA+, dos setores historicamente oprimidos e explorados.
3.
Mesmo aqueles que discordaram de partes do manifesto que apresentei, reconhecem que o documento trouxe a política para o centro da cena. Apresentou análises, propostas e uma agenda concreta para a ação partidária, tanto no Parlamento quanto nas ruas. Demarcou campo de forma clara.
Reafirmo: as disputas internas no PT devem ocorrer no terreno da política, nunca na lógica pequena da luta pelo controle de fundos partidários. Quem afirma o contrário, como fez o editorial do jornal O Estado de S. Paulo, em 12 de março, mente e tenta nos dividir. A nossa história desmente essas maquinações. Somos um partido que sempre se pautou por disputas de ideias, de projetos, de estratégias. E é assim que continuaremos sendo.
A repercussão do nosso manifesto também se deve, acredito, à confiança que conquistei ao longo da minha trajetória de vida e militância. Enfrentei a ditadura militar. Fui preso, torturado, mas não abandonei a luta. Tenho orgulho de ter contribuído para a construção do Partido dos Trabalhadores desde sua fundação, e de ter exercido a sua presidência em momentos decisivos da nossa história: em 1994 e, depois, de 2011 a 2017.
São essas experiências, de coragem, de solidariedade, de convicção, que me impulsionam a aceitar o chamado de tantos companheiros e companheiras para apresentar minha candidatura à presidência Nacional do PT neste Processo de Eleições Diretas (PED).
Tenho consciência de que este PED é uma oportunidade histórica para elevarmos o nosso partido a um patamar de compromisso com as bases sociais que nos fundaram. De reconectarmos o PT à sua essência popular e socialista. De resgatarmos nossa capacidade de mobilização de massas, de formação política, de organização de lutas concretas nos bairros, nos sindicatos, nas escolas, nas periferias, no campo e nas cidades.
Precisamos construir um partido que seja mais do que uma legenda eleitoral. Um partido que seja, novamente, instrumento vivo de transformação social.
Estou preparado para este desafio. Convoco cada militante, cada dirigente, cada simpatizante do nosso projeto histórico, a somar forças nesta caminhada. O Brasil precisa de um PT forte, enraizado, mobilizado e guiado pela política, a dos sonhos, da resistência e da transformação.
Com coragem, com esperança e com muita disposição para a luta, sigo ao lado de vocês. Vamos juntos, companheiras e companheiros, por um PT com a política no comando.
Rui Falcão é deputado federal (PT-SP). Foi presidente nacional do Partido dos Trabalhadores entre 2011 e 2017.