Criado em 1998, com o intuito de avaliar o aprendizado dos jovens que saíram do ensino médio, hoje, o Exame Nacional do Ensino Médio, o ENEM, é a principal ferramenta de entrada da juventude brasileira no ensino superior. O exame serve como o principal instrumento de avaliação dos três principais programas de educação superior no Brasil: o Sisu, o Prouni e o Fies. Esses programas, aliados a algumas políticas públicas, como a Lei de Cotas, fazem com que o exame tenha uma importância ainda maior: democratizar a entrada de estudantes dentro de cursos de ensino superior.
Ainda que tenha assumido outras funções importantes ao longo dos anos, o ENEM ainda pode e deve ser usado como uma importante métrica para avaliar como está a qualidade da educação brasileira, os aprendizados dos jovens, bem como se a legislação que estrutura o modelo de ensino tem dado certo. No Brasil, desde os anos de 2016, o Ensino Médio tem passado por uma reforma, instituída pela Lei Federal Nº 13415 de 2017. Acontece que essa reforma é reprovada por mais da metade da população brasileira e principalmente, por diversos especialistas, por acentuar a desigualdade social, reduzir a carga horária de matérias obrigatórias e esvaziar os conteúdos. O resultado do ENEM 2023 escancara as desigualdades na educação pública e como elas podem piorar se o Novo Ensino Médio não for revogado.
Nesta edição de 2023, tivemos uma importante conquista: o número de estudantes de escola pública inscritos no exame aumentou consideravelmente. Entretanto, conforme divulgado pelo Ministério da Educação, os dados começam a ficar preocupantes após o resultado: Dos mais de 2 milhões de estudantes que realizaram as provas, apenas 60 tiraram notas máximas na redação, e desses, apenas 4 são oriundos de escolas públicas. O Novo Ensino Médio não tem funcionado e cumprido o papel que suas propagandas prometiam. Na realidade, está sucateando a educação pública e distanciando os filhos da classe trabalhadora de seus sonhos.
No ano passado, nós que construímos o movimento estudantil definimos a revogação do Novo Ensino Médio como a principal bandeira de luta, isso porque sabíamos dos impactos que essa política tem trazido para as juventudes brasileiras. A toque de caixa, o sistema de ensino mudou, sem diálogo com professores, estudantes e pesquisadores. Mas como o ensino muda, se esvazia de conteúdos, impõe uma redução drástica na carga horária das disciplinas obrigatórias, mas o exame que avalia esse ensino continua o mesmo? Como o ensino que oferece como disciplina “brigadeiro caseiro” espera que os estudantes de escola pública estejam preparados para estruturar uma redação?
Uma realidade que não se pode negar no Brasil é a diferença da educação privada para a pública, e isso também deve ser colocado em observação. Desde 2016, dizíamos que o projeto por trás do Novo Ensino Médio era tirar o filho da classe trabalhadora das universidades, afinal, não se pode dizer que uma escola pública tem a mesma estrutura e recurso de uma particular para oferecer eletivas, trilhas do conhecimento e oficinas formativas. Na realidade, o que presenciamos era que enquanto as escolas privadas ofereciam aulas de astronomia, educação financeira, planejamento pessoal e empreendedorismo, a pública oferecia aula de como fazer bolo de pote e ajudar no sustento da casa. É inadmissível que seja aceitável que menos de 10% dos estudantes que foram nota máxima na redação sejam de escola pública. É inadmissível que a universidade se torne um sonho distante para as filhas e filhos da classe trabalhadora.
É importante lembrar e estar atento que o presidente Lula, no ano passado, enviou ao Congresso Nacional um novo Projeto de Lei, que altera o Ensino Médio vigente e reinstitui as 2400 horas para as disciplinas obrigatórias. O relator do projeto é ex-ministro de educação do governo Temer e tem sucateado o projeto. É necessário organizar a luta para que o texto original seja aprovado, e que o Ensino Médio volte a ter conteúdo de qualidade e seja pensado também para todas e todos os estudantes.
Por fim, os resultados do último ENEM são alarmantes e só escancaram o desastre que a reforma do novo ensino médio trouxe às e aos estudantes. O ENEM continua sendo uma ferramenta importante para democratizar o ensino superior; no entanto, faz-se necessário que a estrutura do Ensino Médio esteja condizente com a prova. Hoje, temos no poder um governo popular e progressista, eleito pelos estudantes, e falamos em alto e bom som: a revogação do Novo Ensino Médio em 2024 é urgente e devolverá à juventude brasileira os seus sonhos.
Arthur Santos é Diretor de Políticas Educacionais da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas.
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