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Paulo Vanzolini: Além da volta por cima

648849Por Camilo Árabe

Passados dois dias após Paulo Vanzolini encontrar com seus pesados pecados e, mesmo assim, o anjo dar-lhe camisola e sandália, muitas justas homenagens foram feitas e isso é ótimo. Porém, vamos viajar um pouco mais: vamos além da volta por cima.
      “Juízo Final”, Martinho da Vila (composição: Paulo Vanzolini)
Filho de neto de italianos com uma moça interiorana de Itu, Paulo Emílio Vanzolini nasceu na casa do avô na Avenida Brigadeiro Luiz Antônio e foi criado no Jardim América. Ao longo de sua vida, construiu uma longa e importante carreira de cientista e pesquisador e, paralelamente, apresentou composições populares saudadas por grandes nomes da Música Brasileira. Bisavô para dois, avô para oito e pai para cinco, Paulo morreu nesse último 29 de abril, aos 89 anos.
Quem teve a sorte e oportunidade de assistir algum show do cientista e compositor – pelo menos nos últimos tempos – sabe que este, ao invés de cantar, preferia contar histórias, tomar sua cerveja e acompanhar a interpretação dos músicos. Pegue sua cerveja.
Bamba da Ciência
“Quando eu tinha 10 anos meu pai me deu uma bicicleta e eu fui passear. Um lugar perto de casa era o Butantã: resolveu minha vida. No dia que vi as cobras eu me apaixonei e desde então comecei a trabalhar com isso”.
Na prática, a missão como herpetólogo (campo da zoologia que estuda os répteis e anfíbios) iniciou-se ali mesmo, em 1934. Antes de virar Doutor em Harvard, entretanto, Vanzolini estagiou no Instituto Biológico e fez o curso de medicina da Universidade de São Paulo (USP), seguindo a risca conselho de um professor de genética da mesma universidade que era amigo de seu pai.
“Paulo, se você quer estudar répteis que são vertebrados, não venha para a nossa faculdade, pois o professor só dá invertebrados. Vá para medicina, você faz as cadeiras básicas, que são muitos boas. As cadeiras clínicas você enrola com a barriga. Depois você vai para Estados Unidos ou Inglaterra”, contou Vanzolini.

Passados dois dias após Paulo Vanzolini encontrar com seus pesados pecados e, mesmo assim, o anjo dar-lhe camisola e sandália, muitas justas homenagens foram feitas e isso é ótimo. Porém, vamos viajar um pouco mais: vamos além da volta por cima.

Juízo Final”, Martinho da Vila (composição: Paulo Vanzolini)

Filho de neto de italianos com uma moça interiorana de Itu, Paulo Emílio Vanzolini nasceu na casa do avô na Avenida Brigadeiro Luiz Antônio e foi criado no Jardim América. Ao longo de sua vida, construiu uma longa e importante carreira de cientista e pesquisador e, paralelamente, apresentou composições populares saudadas por grandes nomes da Música Brasileira. Bisavô para dois, avô para oito e pai para cinco, Paulo morreu nesse último 29 de abril, aos 89 anos.

Quem teve a sorte e oportunidade de assistir algum show do cientista e compositor – pelo menos nos últimos tempos – sabe que este, ao invés de cantar, preferia contar histórias, tomar sua cerveja e acompanhar a interpretação dos músicos. Pegue sua cerveja.

Bamba da Ciência

“Quando eu tinha 10 anos meu pai me deu uma bicicleta e eu fui passear. Um lugar perto de casa era o Butantã: resolveu minha vida. No dia que vi as cobras eu me apaixonei e desde então comecei a trabalhar com isso”.

Na prática, a missão como herpetólogo (campo da zoologia que estuda os répteis e anfíbios) iniciou-se ali mesmo, em 1934. Antes de virar Doutor em Harvard, entretanto, Vanzolini estagiou no Instituto Biológico e fez o curso de medicina da Universidade de São Paulo (USP), seguindo a risca conselho de um professor de genética da mesma universidade que era amigo de seu pai.

“Paulo, se você quer estudar répteis que são vertebrados, não venha para a nossa faculdade, pois o professor só dá invertebrados. Vá para medicina, você faz as cadeiras básicas, que são muitos boas. As cadeiras clínicas você enrola com a barriga. Depois você vai para Estados Unidos ou Inglaterra”, contou Vanzolini.

De volta à USP, o cientista e professor Paulo Vanzolini, que tinha no pai engenheiro o maior incentivador para o sucesso na vida de pesquisador, não saiu mais. Ao todo, foram mais de cinquenta anos no Museu de Zoologia, do qual foi diretor entre 1962 e 1993.
A pedido de Carvalho Pinto, foi Vanzolini quem escreveu a lei da FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Também por isso, conseguiu um barco para expedições pelo Pais.  “Eu viajei o Brasil inteiro”.
“A técnica do Vanzolini era percorrer espaços e sentir que existiam na fauna espécies do seu interesse. Ele levava muito dinheirinho contado. Então, ele sentava numa casa de fazenda qualquer e chamava os meninos:
– Quem me trouxer alguns lagartos recebe um dinheirinho!
Com isso, ele recebia o conjunto da fauna de lagartos da região”, recorda o geógrafo Aziz Ab’Saber, colega nas excursões. Aliás, o convívio entre os dois rendeu um conhecimento de geomorfologia para Vanzolini, fundamental para sua colaboração com a Teoria dos Refúgios.

“O Paulo é um dos cientistas mais importantes do Século XX, tem importância mundial. O que quer dizer essa teoria: se você pega um animal e isola em determinadas condições, você passa a ter uma espécie nova. Isso é muito importante para teoria da evolução natural”, conta Dráuzio Varella.

Em termos simples, comparando o clima e sua alteração histórica com as idades das espécies de animais e vegetais, pode-se identificar espaços onde se formaram “ilhas do habitat” e, com tal isolamento, surgiam novas espécies. Devido a variação climática, essas áreas isoladas se juntavam novamente num processo repetitivo. Isso explica, por exemplo, a rica diversidade da Floresta Amazônica.

Enfim, todo esse vasto conhecimento do professor Paulo Vanzolini, sempre com seu cachimbo, reflete também na sua curta obra como compositor (considerada por ele) e bastante brasileira. Isto é, há muito mais que samba em suas composições: antes de compositor ou qualquer coisa, Vanzolini foi um ser humano que conheceu muito bem o Brasil.

Capoeira do Arnaldo”, Paulo Vanzolini (composição: Paulo Vanzolini)

Cuitelinho*”, Ana Bernardo 
*Adaptado de canto popular. O versos de Vanzolini são:
A tua saudade corta / como aço de navaia / o coração fica aflito /
bate uma a outra faia / os zóio se enche d’água / que até a vista se atrapaia

Assista o vídeo clicando aqui: https://www.youtube.com/watch?v=NqFFKxXe9PM
Memórias do cabo

A história mais legal da famosa composição “Ronda” não é a de que Vanzolini dela não gostava. Isso é natural relevando a excelência de todos os seus trabalhos e que, quando a compôs, era jovem estudante e cabo do exército, em 1945.“É uma musica de prostituição, de quando eu patrulhava o baixo meretriz. Eu via aquelas mulheres entrando nos bares para procurar alguém e fui bolando da minha cabeça. Agora, é uma musica de meretriz que dona de casa adora e eu não entendo por quê?”, se divertia o autor.

Há outro ponto engraçado. Segundo o compositor, a canção é uma das mais pedidas nos bares de São Paulo. Na maioria dos guardanapos, vinha o escrito: “Honda”.

Embora nunca tenha tido a intenção de gravar suas musicas, apenas as fazia por fazer, “Ronda” foi o primeiro sucesso e aconteceu por acaso. Muito amigo da Inezita Barroso, foram para o Rio de Janeiro para a gravação do primeiro disco da cantora, na época, em 78 rotações. Ao chegarem no estúdio um problema: Inezita não sabia que disco tinha lado B. “Então precisava de uma musica pra gravar nas costas da Moda da Pinga. Ela sabia Ronda e eu estava ali para dar autorização”. Foi de improviso.
Ronda”, Paulo Vanzolini (composição: Paulo Vanzolini)
 

Música Regional e Acerto de Contas

 

“Na Universidade de São Paulo tinha um negócio chamado ‘A Caravana Artística’. Era um show de estudantes que viajava pelo o interior. Eu era o apresentador e tinha um grupo de regional muito bom. Ai, acabei trabalhar com eles e comecei a fazer música”.

Vanzolini nunca fez música profissionalmente e não tinha controle sobre o número composições produzidas. A vida de zoólogo demandava muito tempo no laboratório e as músicas apareciam livremente, como hobby. “Nunca quis perder tempo com isso porque nunca considerei que fosse minha profissão”.

Em 2002, aconteceu o “Acerto de Contas”, uma revisão geral da sua obra em quatro discos. Ao todo, foram 52 músicas gravadas por amigos músicos. Entre eles, Chico Buarque, Martinho da Vila, Eduardo Gudin, Carlinhos Vergueiro e Paulinho Nogueira.

Valsa das Três da Manhã”, Paulinho Nogueira e Isaias do Bandolim (composição: Paulo Vanzolini)
Buarque de Hollanda

Em 1946, Sérgio Buarque de Hollanda se mudou para São Paulo e por meio de sua mulher, Maria Amélia, conheceu Vanzolini. Explica-se: Vanzolini era amigo do pai de Amélia e, com a mudança, este havia  feito um pedido para que a família recém chegada na cidade fosse acolhida com amor.
“Eu me apaixonei na hora. A casa do Sérgio Buarque era o lugar mais interessante e mais vivo de São Paulo. Não saia de lá. A mais velha era a Miúcha, que tinha nove anos”, relatou Vanzolini.
Raiz”, Miúcha (composição: Paulo Vanzolini)

Chico Buarque também bebeu da relação com o biólogo. Enquanto compunha a canção “Ode aos ratos”, do espetáculo musical Cambaio, parceria com Edu Lobo, ligou para Vanzolini em busca de informações técnicas sobre os roedores:

– Vanzolini, aqui é o Chico. Estou escrevendo uma letra sobre ratos e queria que você me ajudasse a saber como eles são. O nariz como é? E a pelagem?

Quando eu for eu vou sem pena”, Chico Buarque (composição: Paulo Vanzolini)

Samba Erudito
“O Paulo não é um músico de vanguarda. É um musico urbano e moderno. O escritor, o poeta, sobretudo, não é mais nada do que aquele de nós que sabe dizer sinteticamente o que não somos capazes de dizer. Ele diz por nos. E o Paulo Vanzolini tem muito essa capacidade de dizer o que é a atmosfera de São Paulo”, disse o crítico Antônio Candido.
Samba Erudito”, Paulo Vanzolini (composição: Paulo Vanzolini)

Vanzolini tem uma parceria com Elton Medeiros, sambista carioca dos mais importantes e antigos. Por intermédio “do pessoal” de Paulinho da Viola, o compositor paulista enviou uma fita para Elton. “Ele não mexeu na letra e praticamente não mexeu na melodia. Mexeu na divisão e virou outro samba. É um dos meus parceiros com mais contribuição. Eu não gostava muito da música, hoje eu gosto pra burro”.- Não sei se o parceiro gostou? – perguntou Elton.

– Nós fizemos e pode ser ruim? – retrucou Vanzolini.

Dançando na Chuva”, Elton Medeiros 

Adoniran

Embora já se conhecessem de antes, Adoniran Barbosa e Paulo Vanzolini tornaram-se amigos de fato onde de fato se faz amigo: no bar. Quando foi trabalhar na TV Record, antes do programa, Vanzolini naturalmente topou com Adoniran no botequim em frente. “Íamos tomar uma cachacinha”.

Uma vez, questionado pelo jornalista Fernando Faro se havia ciúme entre ele e Vanzolini, Adoniran foi na lata: “O Paulo é erudito, eu sou pitoresco. O samba iguala tudo e nós somos amigos”, respondeu Barbosa.

Seu Barbosa”, Ana Bernardo (composição: Paulo Vanzolini)

Vanzolini: Por ele mesmo

“O bom cientista se revela, se realiza no seu laboratório, isso é lógico, ninguém escapa. Mas o cientista feliz é aquele que se integra na mata virgem. A mata é uma dessas coisas em que o todo é mais que a soma das partes”.“Um homem tem que ter amigo e caráter. O resto é tudo secundário”.

“O povo, de cada um, pessoalmente, eu não gosto, mas do povo, em geral, eu gosto muito”.

“O problema da boemia é só um: é você dosar a bebida. Se você virar escravo da bebida você é um homem perdido”.

“Eu gosto de ler, tomar cerveja e ouvir samba”.

“Em matéria de música, eu sou um cavalo em missa em latim”.

“Colega, eu sou zoólogo, vocês não entendem isso. A vida de zoólogo é uma vida muito ciumenta, eu tenho pouco tempo fora do meu laboratório”.

“Um grande cara o Caymmi, bom amigo. Divertido. Compositor magnífico. Uma vez o encontrei num lugarejo de meio de mato sentado numa soleira tocando violão.”

Volta por Cima”, Paulo Vanzolini (composição: Paulo Vanzolini)

 

Leia aqui a entrevista com o compositor na revista Teoria e Debate, feita por Mario Rui Feliciani.
 
Assista o Documentário “Um Homem de Moral”, de Ricardo Dias, sobre Paulo Vanzolini.

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